Daniela Antunes é autora da reportagem premiada

A reportagem de capa da edição 340 da Painel (julho/2023) recebeu o Prêmio ABAG-RP de Jornalismo José Hamilton Ribeiro neste ano. Essa é a 16ª edição da premiação e a segunda vez que uma reportagem da revista da AEAARP é escolhida.

A reportagem selecionada pela banca avaliadora aborda a estratégia agronômica adotada na região para produzir uvas e vinhos. A autora da reportagem é a jornalista Daniela Antunes, editora da Painel desde 2007.

Autoportante e estaiada são os modelos mais utilizados nos 145 mil quilômetros de linhas de transmissão que percorrem o Brasil

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Torres metálicas que sustentam cabos da energia elétrica produzida nas usinas, que normalmente ficam em locais afastados dos grandes centros urbanos e das principais capitais do país, atravessam o país, vencendo obstáculos geográficos, para fazer a energia chegar até o seu destino. As estruturas integram o sistema elétrico, composto pela produção, transmissão e distribuição. A energia é transportada em alta tensão, superior a 100 quilovolts (kV), que, ao se aproximar dos centros de consumo, é reduzida em subestações.

Mapa do sistema de transmissão no Brasil

O Brasil tem 145 mil quilômetros de linhas de transmissão administradas por 133 concessionárias, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (NOS).

As torres são concebidas a partir de projetos de engenharia e construídas de maneira modular (em partes), utilizando predominantemente aço. A escolha do material deve-se à facilidade de transporte e agilidade de montagem da estrutura. Normalmente sustentam três conjuntos de cabos de cada lado, acompanhados por um cabo mais alto, no topo, que é o para-raios.

Segundo o engenheiro Renan Moura Guimarães, professor de Engenharia Civil do Centro Universitário Moura Lacerda na área de estruturas, o perfil do elemento em aço geralmente é do tipo cantoneira (peça em forma de L) e a ligação entre os elementos metálicos que compõem a torre pode ser feita com solda ou parafuso, sendo o último mais comum. “A manutenção periódica da pintura e dos parafusos garante que a estrutura dure por mais de 50 anos”, diz.

A altura assegura que os cabos fiquem distantes do solo e evita o contato elétrico com pessoas, vegetação e veículos que eventualmente atravessem a região, já que são construídas muitas vezes em locais com obstáculos, como vales, rios e montanhas. A estrutura também deve suportar os cabos em qualquer condição de vento e temperatura.

Estaiada x autoportante
Os modelos mais comuns são a estaiada e a autoportante. Segundo o engenheiro elétrico Halley Jose Braga da Silva, coordenador de Viabilidade de Obras de Linha de Transmissão e Subestação da CPFL Energia, o que as caracteriza são a classe de tensão da linha de transmissão e a carga mecânica à qual a torre é submetida. “As torres estaiadas, por exemplo, têm estrutura forte e leve, projetada para suportar alta carga de equipamentos, além de intempéries como ventos extremos”, explica.

Em relação à estrutura, o engenheiro Renan explica que a torre estaiada é feita com mastro treliçado, quando a estabilidade lateral é garantida por meio de estais (cabos) ligados em diversos níveis da torre. Segundo ele, são estruturas mais econômicas, porém necessitam de grande área para a fixação dos estais.

As torres autoportantes são estruturas treliçadas com base alargada em formato de pirâmide e que não precisam do auxílio de estais, suportando-se de forma independente. O treliçado das torres autoportantes pode ser criado de diversas maneiras e a estrutura pode ser subdivida em perna, extensão e corpo básico. “As torres autoportantes necessitam de menor área de instalação, porém são mais caras do que as estaiadas. Elas podem atingir até 120 metros de altura”, argumenta.

As torres autoportantes são utilizadas em terreno mais acidentados devido à sua forma compacta. As estaiadas fixam-se em terrenos com relevos mais suaves, com espaço suficiente para ancorar os estais.

Projeto para instalação
O projeto de uma linha de transmissão busca otimizar os aspectos fundiários, ambientais e técnicos, explica Halley. “Os fundiários levam em consideração a quantidade de proprietários de terras impactados pelo trajeto da linha; os ambientais focam na mitigação de impactos em áreas de preservação permanente, mananciais, sítios arqueológicos, terras indígenas etc.; e os técnicos avaliam a viabilidade de instalação de estruturas em determinados locais”, diz.

O tipo de fundação onde as torres serão instaladas depende diretamente do tipo de solo. “Uma das características principais das estruturas metálicas é a baixa carga na fundação em relação aos outros sistemas construtivos, gerando fundações mais econômicas”, informa Renan.

A fundação pode ser em bloco com estacas ou sapatas rasas, dependendo dos resultados dos ensaios de sondagem de solo. As torres possuem a peculiaridade de não necessitarem de barras de arranque, comuns em pilares de concreto. “A ancoragem na fundação em concreto é feita através de um perfil metálico chamado stub [uma haste dentro do bloco de concreto]”, detalha o engenheiro.

Ainda segundo Renan, como as torres são muito altas, é fundamental que no projeto seja feita a análise dinâmica de vibração para evitar altas deformações na torre quando a estrutura for submetida à ação do vento.

Existem alguns limitadores para a instalação de torres. De acordo com o engenheiro Vinicius dos Santos Lima, da EDS Engenharia, empresa especializada em projetos de linhas de transmissão, é preciso observar a largura da faixa de servidão onde as torres serão instaladas para evitar que o balanço dos cabos se aproxime dos limites de faixa. O relevo do terreno deve obedecer às distâncias de segurança previstas em norma, as limitações das capacidades mecânicas dos cabos condutores e das torres, uma vez que quanto maior a distância entre torres, maior será a carga de tensionamento nos cabos instalados”, detalha.

O engenheiro Eduardo Karabolad Filho, também da EDS Engenharia, salienta que o plantio de algumas culturas próximas às torres não é indicado por causar riscos ao produtor ou até mesmo para a linha de transmissão. “A cana-de-açúcar, por exemplo, não deve ser plantada próxima as torres devido ao risco de fogo no local. Também há restrições para árvores frutíferas com altura acima de 3 metros e árvores de grande porte, como eucaliptos, pinheiros, araucária, porque podem causar aproximação dos cabos energizados”.

Todos os projetos de linhas de transmissão são regulamentados pela ANEEL (Agencia Nacional de Energia Elétrica) e a implantação deve seguir normas técnicas. As principais são: a NBR 8800:2008 – Projeto de Estruturas de aço e de estruturas mistas de aço e concreto; NBR 6120:1980 – Cargas para cálculo de estruturas de edificações; NBR 6123:1982 – Ação do vento em edificações e Procedimento (SDT-240-410-600, 1997) – Telebrás.

Pesquisa do IBGE identificou o aumento de 120% na presença de mulheres no setor da construção civil entre os anos 2007 e 2018

Nesta sexta-feira, 12 de maio, a Associação de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Ribeirão Preto (AEAARP) promove a palestra Mãe, mulher e seus desafios na sociedade moderna com a psicóloga Eliana de Pádua. Ela vai falar sobre desafios das mulheres desde a Grécia Antiga até os tempos atuais. A organização é do grupo AEAARP Mulher.

“Será uma conversa sobre como a mulher vem se empoderando e ocupando espaços em que antes não eram vistas e nem aceitas”, fala Eliana.

Uma pesquisa realizada pelo IBGE identificou o aumento de 120% na presença de mulheres no setor da construção civil entre os anos 2007 e 2018. Atualmente, são mais de 200 mil mulheres ocupando cargos em escritórios de engenharia, indústrias e canteiros de obras. 

A palestra será às 18h30 na AEAARP - Rua Clemente Ferreira, 330. O evento é gratuito.

Reconhecido pelo potencial econômico, o bambu pode ser utilizado nas indústrias de alimentos, cosméticos e construção civil

Há dois lugares no mundo onde não existem bambus nativos: na Europa e na Antártida. Em todos os outros continentes somam-se 1.300 espécies, a maioria nos países asiáticos - China, Japão, Tailândia, Indonésia, Malásia, Myamar – onde também o uso desse material é milenar.

Índia, Bangladesh, países das Américas Central e do Sul, África e Austrália têm espécies nativas de bambu.

O bambu pode substituir ou complementar outras matérias primas, como fibra, carvão vegetal e madeira, e é matéria-prima para revestimentos e estruturas na construção civil e para movelaria e artesanato. Do ponto de vista ambiental, a planta promove enriquecimento químico e físico do solo e pode ser usada para recuperação de áreas degradadas.

Vantagens
O bambu se adapta às mais diversas condições ambientais, não exige grandes cuidados com a manutenção e é de fácil manejo, além de ter custo reduzido de implantação, característica que atrai investidores.

Quando adequadamente manejado, tem elevada produção de biomassa em curto período de tempo, em comparação a outras espécies usadas na silvicultura, como o pinus e eucalipto, por exemplo.

Não possui a necessidade de replantio após as colheitas, já que novos colmos são produzidos anualmente, por um período que varia de acordo com a espécie. Outra vantagem é a boa qualidade de suas fibras, que podem ser usadas na indústria de papel e celulose, na formulação de produtos que exigem maior resistência ao rasgo e capacidade de carga, como os sacos para cimento.

O bambu cresce rápido e por isso mesmo sequestra mais gás carbônico do ar do que outras plantas. “Há registros de taxas de crescimento da ordem de 10 cm/dia a 100 cm/dia em condições ambientais favoráveis. Em seis meses de crescimento, um colmo de um bambu gigante pode atingir a altura de 20m a 25m”, destaca Luiz Barbieri.

Muitos bambus são conhecidos por seus efeitos biológicos – são antioxidantes, antirradicais livres, antienvelhecimento, antibacterianos – e também podem ser usados na prevenção de doenças cardiovasculares, segundo Maria Tereza Grombone Guaratini, pesquisadora do Instituto de Botânica de São Paulo.

O destino industrial da planta é a indústria de papel e celulose, bebidas e cosméticos. Existem pesquisas sobre a aplicação na área de nanotecnologia – uma delas seria a obtenção de nanopartículas de carvão ativado, usadas para a fabricação de filtros de alta eficiência.

O bambu ainda pode ser utilizado como fonte de alimentação, por meio de brotos e farinhas, conforme pesquisa desenvolvida pela Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp.

Cenário do Bambu
No Brasil, o bambu é encontrado em maior concentração na Amazônia. Existem cerca de 260 espécies no país, distribuídas em 35 gêneros. Entre as principais espécies estão a Bambusa vulgaris, Bambusa vulgaris variedade vittata, Bambusa tuldoides, Dendrocalamus asper, Guadua angustifolia, Phyllostachys aurea (cana-da-índia ou vara-de-pescar) e Phyllostachys pubescens (“Mossô”).

O engenheiro agrícola Antonio Ludovico Beraldo, professor titular aposentado da Faculdade de Engenharia Agrícola da Unicamp, conta que o bambu chegou ao país com os colonizadores portugueses, trazidos de suas possessões na Ásia (Goa e Cantão). Segundo ele, as primeiras espécies pertenciam aos gêneros Bambusa e Dendrocalamus, posteriormente, espécies de bambus do gênero Phyllostachys foram trazidas pelos imigrantes japoneses.

“No entanto, o Brasil apresenta uma grande quantidade de espécies de bambus nativos, que ocorrem em ambiente de mata, sendo ainda praticamente desconhecidos pela população”, afirma Antonio, que é co-autor dos livros “Bambu de Corpo e Alma” e “Bambu: Características e Aplicações em Engenharia e na Arquitetura”.

É no Estado do Acre que está a maior reserva natural em espécies nativas de bambu no mundo, com 4,5 milhões de hectares, o que corresponde a 20,4% do total dos 22 milhões de hectares plantados em todo o planeta, segundo dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

A floresta é constituída principalmente pela espécie gigante Guadua aff chaparensis e em menor escala, pelo Guadua sarcocarpa. “Eu costumo dizer que, se a colonização do Brasil tivesse começado pelo Acre, certamente, hoje, seríamos, juntamente com a China, a Índia e o Japão, uma dessas potências do bambu industrializado”, afirma o engenheiro agrônomo José Luiz Barbieri.

Ocorrência de bambu nativo no Acre

A floresta vem sendo estudada por várias instituições de pesquisa. A Embrapa Acre desenvolveu, entre 2009 a 2016, pesquisas com bambu nativo do gênero Guadua.

“Os resultados estão sendo utilizados para a conservação dos recursos genéticos e para o manejo sustentável das populações nativas de bambu”, detalha o engenheiro agrônomo Elias Melo de Miranda, pesquisador da Embrapa Acre.

Em São Paulo
No Estado de São Paulo, o Instituto Agronômico de Campinas (IAC) mantém, na Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento (UPD) de Tatuí, o Banco Ativo de Germoplasma de Bambu. São 70 espécies, distribuídas em uma área de aproximadamente dois hectares. É considerada a maior coleção existente na América Latina.

O engenheiro agrônomo Marcelo Ticelli, pesquisador científico e chefe da UPD Tatuí, conta que a implantação teve início por volta do ano de 1956 até 1963 e as espécies introduzidas foram trazidas dos Estados Unidos, Peru, Porto Rico, El Salvador, Portugal, Trinidad.

Em 2014, novas espécies trazidas da China foram inseridas na coleção, formada por gêneros de bambus exóticos, como o Dendrocalamus, Phyllostachys, Bambusa, Guadua, Thyrsostachys, Gigantochloa, Pseudosasa, Ochlandra e também diversas espécies raras, como a Ochlandra travancorica, Thirsostachys siamenses, Thirsostachys olliveri, Phyllostachys makinoi, Bambusa bambos e Dendrocalamus sikkimensis.

De acordo com Antonio Beraldo, o bambu é plantado principalmente por pequenos produtores.

Economia
Comercialmente, o bambu chama a atenção há pouco tempo. Em 2011, foi aprovada a Lei do Bambu (Lei nº 12.484/2011), que instituiu a Política Nacional de Incentivo ao Manejo Sustentado e ao Cultivo do Bambu (PNMCB), com o objetivo de incentivar o manejo sustentável e o cultivo das espécies nativas e entre os agricultores familiares.

Em 2017, o país foi incorporado como o 43º país membro da Rede Internacional de Bambu e Rattan (INBAR), entidade intergovernamental que reúne os países protagonistas no mercado mundial do bambu e movimentam cerca de 60 bilhões de dólares ao ano.

Segundo Elias, pesquisador da Embrapa Acre, a criação da Rede Brasileira do Bambu (RBB), de perfil acadêmico, e da Associação Brasileira dos Produtores de Bambu (Aprobambu), que busca incentivar as pesquisas e o empreendedorismo, possibilitou a divulgação e promoção do bambu como alternativa econômica.

“Trata-se de um recurso rapidamente renovável que pode ser fonte contínua de matéria-prima para diferentes mercados e uma opção de negócio sustentável”, fala o pesquisador.

Desvantagens
Diversas espécies de bambus lenhosos raramente produzem sementes e, quando isso ocorre, as sementes são de baixa viabilidade germinativa, tornando a obtenção de mudas para plantações em larga escala um fator limitante.

Para a produção de mudas para plantações comerciais é recomendado o uso da propagação in vitro ou micropropagação. “A produção de mudas em pequena escala é um processo lento e pode ser feito por propagação vegetativa convencional, ou seja, por meio do enraizamento de segmentos de colmos com nós ou de ramos secundários. Após o processo de enraizamento é possível multiplicar as mudas pelo desmembramento dos perfilhos que são emitidos de cada muda original”, explica Elias.

O engenheiro agrônomo alerta que é necessário ter cuidado com espécies de hábito de crescimento do tipo alastrante por serem plantas muito agressivas na ocupação espacial do terreno, podendo se transformar em invasoras. “A canada-índia ou bambu mirim (P. aurea), por exemplo, deve ser manejada para evitar que se alastre para locais indesejados, pois a dificuldade e o custo para a erradicação podem ser elevados”.

A vulnerabilidade ao ataque de insetos xilófagos e fungos, devido ao seu elevado teor de amido, também é uma desvantagem. “Entretanto, o tratamento químico dos colmos por imersão praticamente elimina este problema”, ressalta o agrônomo
José Luiz.

Escola de bambu - Inspira investimento
Agrônomo ribeirão-pretano frequentou escola feita com bambus em 1950 e decidiu investir na planta

O engenheiro agrônomo José Luiz Barbieri é um admirador de bambu. Nos anos de 1980, ao adquirir algumas terras em Uberaba (MG), iniciou o plantio com a espécie Dendrocalamus asper.

Foi a memória afeita da infância no “Jardim da Infância Machado de Assis”, que ele frequentou nos anos de 1950, que incentivou o investimento. A escola, que funcionava dentro do Parque Municipal do Morro de São Bento, em Ribeirão Preto, era totalmente construída com bambus gigantes, da espécie Dendrocalamus asper, inclusive o telhado.

Hoje, José Luiz possui um banco de germoplasma de bambu, com 11 das 20 espécies mais importantes do mundo, voltado, principalmente, para a construção, arquitetura, decoração, movelaria e artesanato.

Bambu: alternativa construtiva
Planta é utilizada em sistemas construtivos e pode substituir o aço no reforço de estruturas de concreto

O uso do bambu na construção civil movimenta US$ 30 bilhões na China, que responde por metade do mercado mundial, segundo informações do estudo “Economia do Bambu no Brasil: Tecnologia e Inovação na Cadeia Produtiva – Perspectivas e Desafios” realizado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI).

Fora da China, em países da América Latina – Colômbia, Costa Rica e Equador, por exemplo – existem projetos bem-sucedidos de habitações populares com fins de interesse social e até de grandes edificações, como pavilhões de exposições, hotéis e edifícios verticais.

O mercado, segundo o engenheiro civil Vitor Marçal, tem sido atraído pela versatilidade dessa matéria-prima – leve, resistente e de fácil manuseio – e pela boa imagem pública que essas construções proporcionam. Vitor é secretário executivo da Associação Brasileira de Produtores de Bambu (Aprobambu) e acrescenta que, além dessas características, a planta também é suficientemente resistente para manter as características de estruturas no decorrer do tempo de uso.

“É um elemento construtivo que pode agregar bastante ao setor da construção civil. A beleza estética e o grande apelo ecológico são características interessantes para seu uso, diminuindo consideravelmente o custo energético para produção desse material, seu beneficiamento, aproveitamento e acabamento final”, destaca o engenheiro.

De acordo com a Maria Tereza Grombone Guaratini, pesquisadora do Instituto de Botânica de São Paulo, bambus são considerados um dos mais importantes e valiosos recursos florestais não madeireiros. “Os bambus lenhosos possuem propriedades físicas e mecânicas que os tornam adequados para serem utilizados no desenvolvimento de produtos normalmente produzidos com madeira nativa ou de reflorestamento”, destaca.

Aplicação
O bambu pode ser aproveitado nos mais diversos segmentos da construção civil, como escoras, proteção de obra, formas, elementos estruturais (colunas, vigas, caibros) e laminados de bambu, que podem ser utilizados tanto como elementos estruturais (pisos, revestimentos e painéis estruturais) ou de vedação.

Pode ser cortado em ripas, dando mais flexibilidade ao material e permitindo seu uso em sistemas construtivos arqueados e estruturas em casca. As mesmas ripas podem ser industrializadas, sendo planificadas nas quatro faces e coladas umas as outras em diferentes posições, produzindo assim “madeira” laminada colada de bambu, que possui resistência e durabilidade tão grande quanto madeiras de lei. “O laminado de bambu pode ser empregado em diversos setores da construção civil, desde formas, revestimentos, pisos, coberturas (telhas) e elementos estruturais”, afirma Vitor.

O bambu substitui também grandes tubulações que tradicionalmente são produzidas com substâncias cimentícias, metal ou plásticos, sendo cerca de 50% mais leves e 30% mais baratas, proporcionando redução de custos, logística e montagem, permitindo menor consumo, menor tempo de montagem, equipamentos mais leves e menos mão de obra.

Já os colmos, desde que colhidos no tempo ideal, tratados e secos, podem ser utilizados como escoras, formas, proteção de obra, e principalmente como colunas, vigas e outros elementos estruturais em diversos sistemas construtivos utilizados atualmente.

Diversas espécies de bambu apresentam características indicadas para serem utilizadas na construção civil. Gêneros de bambu como Phyllostachys, Bambusa, Dendrocalamus e Guadua são os mais utilizados na construção civil brasileira. “Esses bambus apresentam diferentes diâmetros que podem variar de um centímetro, no gênero Phyllostachys, até 25 centímetros no gênero Dendrocalamus”, informa Vitor.

Dependendo das características de cada um podem ser utilizados em funções estruturais. Bambus mais finos, por exemplo, são ideais para vedações e acabamentos. À medida que os diâmetros aumentam podem ser aproveitados como caibros e peças diagonais de travamento superior. Bambus com maior diâmetro ou feixes de bambus de menor diâmetro servem como vigas e colunas.

“Independente do tipo de bambu a ser utilizado é imprescindível que estejam tratados e secos, possibilitando o desenvolvimento de estruturas que trabalhem menos após a execução da obra e garantindo a vida útil adequada contra agentes patológicos, como fungos e insetos”, alerta o engenheiro.

Sistemas construtivos
Ainda de acordo com o engenheiro Vitor, a falta de conhecimento sobre o material faz com que um número maior de pessoas utilize o bambu de forma incorreta, sem tratamentos adequados e com técnicas ineficientes, fazendo com que algumas estruturas não tenham todo o potencial de utilização desse material e terminem por diminuir sua importância e até negativar a opinião dos consumidores por este tipo de produto.

“É necessário que o bambu seja utilizado da forma correta, favorecendo assim o desenvolvimento de sistemas construtivos eficientes e resistentes, mostrando todo o potencial de aproveitamento estrutural do bambu”, salienta.

A maioria dos sistemas construtivos permite a utilização do bambu. Podem ser desenvolvidas estruturas feitas totalmente em bambu ou nas quais o bambu é utilizado junto com o concreto armado, perfis metálicos, madeira, dentre outros.

Vitor ressalta que o projeto deve ser realizado por profissional capacitado.

“Quando diferentes sistemas construtivos são usados em um mesmo projeto é importante que esse profissional tenha conhecimento de ambos e principalmente entenda como utilizá-los em conjunto de forma eficiente e resistente”.

Obras executadas somente com bambu estrutural também demandam conhecimento sobre uniões e conexões entre peças de bambu. “O uso de colmos de bambu, juntamente com elementos de concreto armado, madeira e perfis metálicos demandam um entendimento global e local dos esforços atuantes para o projeto e execução dos sistemas conectivos e interação entre os diferentes elementos estruturais”, informa.

Os tipos de vedação e instalações também precisam de atenção por parte do projetista e construtor. Alguns sistemas estruturais dificultam o uso de vedações convencionais, como tijolo cerâmico, sendo necessário maior entendimento de como essas vedações e instalações serão desenvolvidas no decorrer da obra.

Feito com bambu
O bambu é protagonista de obras de arte da arquitetura sul-americana

O colombiano Simón Vélez tornou-se um dos arquitetos mais importantes do mundo pelo uso inovador do bambu na construção. Simón desenvolveu novos métodos e sistemas de apoio estrutural, transformando o material em um recurso moderno e flexível, que pode ser usado em todos os tipos de edifícios.

Com projetos espalhados por 11 países, dentre eles, a Igreja Nuestra Señora de La Pobreza, em Pereira, Colômbia, o Museu Nômade Zócalo, na Cidade do México, e ZERI Pavilhão para a Expo 2000, em Hannover, na Alemanha.

Vélez também projetou o Crosswaters Ecolodge, um destino de ecoturismo nas florestas da Reserva de Montanha Nankun Shan, na província de Guangdong, na China, considerado o maior projeto comercial para o uso de bambu.

Brasil não tem norma técnica para uso do bambu
Segundo a ABNT, proposta está em fase de elaboração e será aberta à consulta pública

Normas internacionais para o uso estrutural do bambu existem desde 1973 e vêm sendo melhoradas e adequadas à realidade de cada país. As normas internacionais ISO 22156 e ISO 22157 norteiam várias outras de países de todo o mundo, principalmente sul-americanos, como Colômbia, Peru e Equador.

No Brasil, o bambu ainda não é regulamentado, porém já é amplamente utilizado, tanto em estruturas rurais quanto em projetos de maior complexidade estrutural. “Como as normas nacionais ainda não estão vigentes os responsáveis técnicos precisam se embasar em normas internacionais e experiência prática sobre o material”, explica Vitor Marçal, secretário executivo da Associação Brasileira de Produtores de Bambu (Aprobambu).

Atualmente, a Comissão de Estudo de Estruturas de Bambu (CE002:126.012) atua junto à Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), no âmbito do Comitê Brasileiro da Construção Civil (ABNT/ CB-002), para definir parâmetros de aproveitamento estrutural do bambu no país.

Duas normas técnicas estão em desenvolvimento na ABNT: a Norma Brasileira 16828-1 (Estruturas de Bambu - Parte 1: Projeto) e a NBR 16828-2 (Estruturas de Bambu – Parte 2: Determinação das propriedades físicas e mecânicas).

A primeira define os requisitos básicos exigidos para projeto de estruturas feitas com colmos de bambu e a segunda estabelece métodos de ensaio para avaliar as propriedades físicas e mecânicas do bambu. Os resultados dos ensaios poderão ser usados para fins de controle de qualidade das construções de bambu.

O documento foi redigido por profissionais, pesquisadores e bambuzeiros de vários estados brasileiros, nos últimos dois anos, em reuniões bimestrais em diferentes estados brasileiros. Segundo a assessoria de imprensa da ABNT, os documentos estão em fase de editoração e ainda não foram submetidos à Consulta Nacional.

“Torcemos para que em breve essa norma já esteja disponível para aproveitamento nacional orientando e definindo conceitos básicos de qualidade do bambu, cálculo estrutural, projeto, execução e manutenção de estruturas desenvolvidas com bambu no Brasil”, salienta Vitor, que é também secretário da Comissão de Estruturas de Bambu.

Resíduo é gerado durante o processo de fabricação do etanol. Na safra de 2018/2019 foram produzidos 397 bilhões de litros de vinhaça no Brasil

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O Brasil é o maior produtor mundial de cana-de-açúcar e o segundo maior produtor e exportador de etanol, atrás apenas dos Estados Unidos. Na safra de 2018/2019 a produção foi de 620,4 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, sendo 33,14 bilhões de litros de etanol, 21,7% maior na comparação com 2017/18, segundo dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Para cada litro de etanol produzido pela indústria são gerados de 10 a 15 litros de vinhaça, segundo dados da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA).

A vinhaça, que no passado era descartada diretamente em rios e em mananciais provocando prejuízos ambientais, hoje é opção para adubar o solo em razão da alta concentração de potássio, fundamental no processo de fotossíntese, da absorção de nutrientes em diversas reações enzímicas no interior da planta, reduzindo o uso de fertilizantes químicos. A vinhaça é também fonte de energia por meio do processamento do biogás.

Aplicação da vinhaça
“A vinhaça elevou patamar de produtividade de muitos solos, quer pelo aporte de matéria orgânica como pelos nutrientes contidos”, explica a engenheira agrônoma Raffaella Rossetto, pesquisadora da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA)/ Programa Cana do Instituto Agronômico (IAC).

A utilização de vinhaça como fertilizante agrícola teve início na década de 1970 e se intensificou no final dos anos de 1990, principalmente devido ao aumento dos preços dos fertilizantes químicos. É aplicada nos canaviais na forma líquida, por meio da fertirrigação, técnica de adubação que utiliza a água de irrigação para levar nutrientes ao solo. As usinas já aplicam 100% da vinhaça produzida no próprio cultivo da cana.

Desde a década de 1980, o resíduo vem sendo utilizado em área total, em irrigação nas soqueiras, com o uso de canhões aspersores que lançam por uma moto-bomba a vinhaça succionada diretamente do canal principal.

Irrigação com canhão aspersor

Há também a tendência de utilização da vinhaça aplicada na linha da cana. Em geral, essa prática tem ocorrido quando a vinhaça é mais concentrada em potássio. “A aplicação na linha é mais rápida e eficiente, com ganhos econômicos. Ambientalmente apresenta vantagens por não acarretar problemas de vazamentos e encharcamentos no solo”, destaca Raffaella.

A quantidade de vinhaça aplicada no canavial é definida com base no teor de potássio e na análise química do solo, informações que compõem o Plano de Aplicação de Vinhaça (PAV). Essa documentação, conforme explica o engenheiro agrônomo Danilo Alfenas Voltarel, é protocolada na Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB).

“Por meio desta análise, juntamente com o PAV, é estabelecida a lâmina ideal de aplicação de vinhaça e o volume de determinada calda ou solução rica nos demais nutrientes importantes para o desenvolvimento da cultura. Esta calda ou solução deve ser homogênea, incorporada à vinhaça também de forma homogênea e aplicada na dose programada através das necessidades culturais da área”.

No estado de São Paulo, a NormaTécnica P4.231/2005, da CETESB, define o cálculo para determinar a quantidade de vinhaça a ser aplicada no solo, como deve ser o monitoramento, além de dar disposições gerais para armazenamento e aplicação da vinhaça.

“Em geral, volumes de 150m3/ha são doses médias comuns. Para a vinhaça aplicada na linha da cana, o volume de cerca de 40a50 m3/ha permite a aplicação da dose de potássio suficiente para o manejo da soqueira da cana”, esclarece Raffaella.

Aplicação da vinhaça concentrada na linha de cana

Há vantagens e desvantagens financeiras no uso da vinhaça como fertilizante: o produtor economiza na compra do potássio, que na maioria das vezes é importado, mas tem de investir mais na aplicação – o uso de aspersores e aplicação da vinhaça em área total gera um gasto superior à aplicação de cloreto de potássio.

No modelo de aplicação na linha da cana, como fertilização líquida, deixa o processo mais econômico. Neste caso, os custos são semelhantes aos da aplicação de cloreto de potássio sobre a palha, considerando uma mesma distância.

Produtividade x problemas ambientais
O efeito positivo da vinhaça na produtividade da cana ocorre em praticamente todas as variedades, nas mais diversas condições de solo e clima. Em geral, a dose utilizada prevê a quantidade sufi ciente de fornecimento de potássio que a planta precisa durante o ciclo de crescimento.

“Evidentemente, a vinhaça não é um fertilizante completo, que supre todas as necessidades da cana, de forma que muitos pesquisadores se dedicaram a estudar como, quando e com o que complementar a vinhaça. De certa forma, para as soqueiras é necessária complementação da vinhaça com nitrogênio. É preciso também estar atento aos desequilíbrios entre potássio e magnésio, que podem gerar problemas no acúmulo de sacarose na cana”, alerta Raffaella.

Altas doses de vinhaça ou o uso de vinhaça com alto teor de potássio podem acarretar atrasos na maturação da planta, redução do teor de sacarose e de fibras e acúmulo de cinzas no caldo, prejudicando a matéria prima, principalmente para a produção de açúcar.

Em caso de armazenamento ou aplicação incorreta, a vinhaça também pode atingir corpos de água e, em função de seu alto teor de matéria orgânica, reduzir a quantidade de oxigênio na água causando a morte de peixes e tornando a água imprópria para o consumo, alerta Antonio Luiz Lima de Queiroz, assistente executivo da presidência da CETESB.

Raffaella explica que o risco de poluição do lençol freático ocorre se a vinhaça for aplicada em solos muito rasos (menos de 3 m de profundidade), arenosos, onde a drenagem é rápida ou pode ocorrer escorrimento superficial ou erosão.

No estado de São Paulo, a vinhaça é aplicada em solos argilosos, ou de textura média, mais profundos. “Nesses solos, quando se utiliza a dose recomendada pela portaria da CETESB, não existe risco de poluição de lençol freático. Cuidados devem ser tomados em solos arenosos próximos a córregos, rios, ou corpos d´água, e solos com lençol freático superficial”.

O engenheiro agrônomo Danilo enfatiza que quanto maior a disponibilidade de áreas factíveis e aplicadas de forma racional, maiores serão os ganhos. A vinhaça, segundo ele, contribui com os atributos químicos do solo, resultando em melhor desenvolvimento da cultura, economia de insumos, óleo diesel, mão de obra e menor pisoteio na lavoura. “Vinhaça é um fertilizante agrícola e deve ser tratado como tal”, ressalta.

Vinhaça = energia
O aproveitamento de resíduos da cana-de-açúcar (vinhaça, torta de filtro e bagaço da palha) na produção de biogás começou a ser estudado pela indústria sucroalcooleira na década de 1980. Na época, porém, os projetos não avançaram por serem economicamente inviáveis.

Novas tecnologias – 100% nacional – desenvolvidas nos últimos 10 anos possibilitaram a geração de energia utilizando a vinhaça como matéria- -prima. Hoje, o Brasil já conta com seis plantas de produção de biogás a partir de resíduos da cana-de-açúcar.

A primeira foi instalada em 2012, no município de Tamboara, no Paraná, pela Cooperativa Agrícola Regional de Produtores de Cana (Coopcana), formada por 127 produtores rurais, em parceria com a empresa Geo Energética, especializada na produção de biogás a partir dos resíduos da indústria sucroalcooleira. A usina tem capacidade para gerar 4 megawatts, o suficiente para abastecer uma cidade de 10 mil habitantes.

Planta de Tamboara, no Paraná
Planta de Tamboara, no Paraná

Há outros projetos em desenvolvimento com previsão para entrar em operação em 2020: a Usina Bonfim, em Guariba (SP), da empresa Raízen, e a Usina Narandiba, em Presidente Prudente (SP), do Grupo Cocal. Esta segunda, terá capacidade de gerar 67 mil Nm3 de biometano por dia, que serão inseridos na rede de distribuição da empresa GasBrasiliano, sócia no projeto.

O biogás produzido nestas usinas poderá ser utilizado em substituição ao diesel no processamento da cana - 1 tonelada precisa de 4 litros de diesel - e no abastecimento da própria frota.

Em Mato Grosso, existe ainda a planta, já em escala comercial, da Usina Adecoagro, desenvolvido pela Methanum Engenharia Ambiental, que utiliza o biogás para geração de energia térmica.

Além de resíduos do setor sucroenergético, a indústria do biogás trabalha com resíduos da agricultura e saneamento. Segundo a Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), o setor cresceu 40% ao ano, entre 2010 e 2018. A produção está concentrada no Sul e no Sudeste.

Atualmente, são 419 plantas nas mais variadas escalas. O setor dobrou o número de plantas, em especial devido ao crescimento de pequenos produtores, que correspondem a 60% do número de plantas de biogás no país.

A produção de biogás a partir dos resíduos da indústria sucroenergética ainda é pequena, segundo o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2029. No entanto, é a que apresenta o maior potencial - três vezes maior que o da agricultura e oito vezes maior que o do saneamento.

O PDE é um documento anualmente preparado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), com o apoio e seguindo as diretrizes da Secretaria de Planejamento e Desenvolvimento Energéw co (SPE/MME) e da Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Biocombusutíveis (SPG/MME), e indica as perspectivas da expansão do setor de energia para os próximos dez anos.

As projeções da EPE para 2029 são de 852 milhões de cana processada, o que representa um potencial de produção de biogás de 46 milhões de Nm3/dia, considerando apenas o aproveitamento da vinhaça e da torta de filtro como resíduos.

“Além de ser uma solução para resolver um passivo ambiental, a produção pode influir diretamente na balança comercial. O Brasil importa 22 milhões de Nm3/dia de gás da Bolívia, ou seja, o potencial de geração de biogás do setor sucroenergético (46 milhões Nm3/dia) cobriria em duas vezes o volume importado. O aproveitamento da vinhaça como substrato do biometano reduz em mais de 90% as emissões de gases do efeito estufa liberados pelo resíduo quando descartado no ambiente”, destaca Alessandro Sanches, gerente- -executivo da Abiogás.

No centro da cidade, três casarões construídos no início do século passado são exemplos de preservação, investimento e persistência.

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Dois ícones da arquitetura cafeeira do interior paulista estão, finalmente, em obras. A intervenção na Biblioteca Altino Arantes é inovadora e arrojada e, grande surpresa para o público, o Palacete Camilo de Mattos também será restaurado. As duas iniciativas são do setor privado.

“Ainda temos muitos bens históricos abandonados no quadrilátero central, como o Hotel Brasil, as ruínas do Palacete Albino de Camargo, que também devem receber atenção especial. Se a cidade é feia e abandonada, ela é motivo de tristeza aos olhos das pessoas que caminham pelo centro”, observa o arquiteto Cláudio Bauso.

Casarões e palacetes construídos no início do século XX na região central de Ribeirão Preto representam o período em que a cidade foi uma das maiores produtoras de café do Brasil. Os imóveis caracterizam a formação de uma cidade associada ao complexo cafeeiro, dos pontos de vista político e econômico. As construções invariavelmente demonstravam a riqueza e o poder daquele período histórico.

As mudanças culturais e econômicas do final do Século XX provocaram a verticalização do centro. Muitas das construções do período áureo do café deram lugar a edifícios residenciais e comerciais. Alguns casarões resistem, protegidos pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural de Ribeirão Preto (Conppac). “Preservar esses bens significa ter uma memória registrada não só do modo de edificar como também do modo de viver e residir no período do café”, explica a historiadora Lilian Rosa.

Na arquitetura, completa a historiadora Sandra Regina Firmino Abdala, ficam registrados erros e acertos do passado e do presente. “Como sociedade, nos apropriamos desses conhecimentos, sem os quais fica difícil construirmos um futuro melhor para nós mesmos”, argumenta Sandra, que atua na Divisão de Patrimônio Cultural da Secretaria Municipal da Cultura de Ribeirão Preto.

Segundo a professora de história Nainôra Maria Barbosa de Freitas, docente do Centro Universitário Barão de Mauá, a preservação dos bens culturais depende de políticas públicas aplicadas em educação permanentemente com o objetivo de trabalhar com a identidade e a memória de uma comunidade. “Tarefa de uma vida inteira, aliando educação, cultura, bem como todos os aspectos de uma sociedade que se esforça para garantir às gerações seguintes a preservação da história e da memória. Acredito em parcerias entre poder público e privado junto com o esforço da sociedade civil”.

Segundo ela, quando a memória não é respeitada, a identidade e o exercício da cidadania são deixados de lado e as referências, que permitem ligar o passado com o futuro, são esquecidas.

“Uma cidade precisa destas referências culturais para avançar construindo cidadania atuante, em que o cidadão seja partícip partícipe e não apenas um mero espectador, usuário da cidade onde mora, ou trabalha”, defende.

O patrimônio cultural é um dos principais agentes para salvaguardar a identidade original de uma comunidade.
Sandra Regina Firmino Abdala – historiadora

Quando nos referimos ao patrimônio olhamos o passado mas, a referência são as escolhas que queremos deixar para as gerações seguintes, ou seja, para o futuro.
Nainôra Maria Barbosa de Freitas, professora de história

Biblioteca Altino Arantes

“Presente para a comunidade e resgate do centro de Ribeirão Preto”. É assim que Wagner Chiodi, diretor administrativo da Fundação Educandário Coronel Quito Junqueira, define a restauração da Biblioteca Altino Arantes. A Fundação é mantenedora do local.

O imponente casarão, localizado na Rua Duque de Caxias, na região central de Ribeirão Preto foi projetado pelo escritório do arquiteto Ramos de Azevedo, um dos mais importantes arquitetos brasileiros no início do século passado. O prédio foi construído em 1932 para ser residência de Francisco Maximiano Junqueira, o coronel Quito Junqueira, pecuarista, cafeicultor e empresário, e Theolina Zemilla de Andrade Junqueira, conhecida como Sinhá Junqueira.

Quito Junqueira faleceu em 1938. O casal não tinha herdeiros o que inspirou sua viúva, Sinhá Junqueira, a criar em 1952 a fundação que leva o seu nome com o intuito de que seu patrimônio fosse usado para manter as obras filantrópicas às quais se dedicou durante toda a vida. Ela faleceu em 1954 e no seu testamento deixou expresso o desejo de que a sua residência se tornasse uma biblioteca pública. No ano seguinte, 1955, foi inaugurada a Altino Arantes.

O prédio é tombado pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural de Ribeirão Preto (Conppac) e pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), órgão estadual dedicado à preservação. Em 2014, a Fundação Educandário assumiu a Biblioteca com o objetivo de recuperar o prédio e o acervo. “Havia vitrais quebrados, trincas nas paredes e alguns livros estavam desmanchando”, explica Wagner.

A obra de restauração e ampliação da biblioteca começou em 27 de janeiro de 2019 e deve ser concluída até o final deste ano. Com investimento de R$ 11 milhões, proveniente exclusivamente da Fundação Coronel Quito Junqueira, o projeto do escritório Pitá Arquitetura, de São Paulo (SP), prevê a restauração integral do prédio, realizada por um especialista em restauro, e a construção de um anexo, com arquitetura horizontalizada e minimalista. A área total passará de 600 m² para 1.490 m².

Segundo Wagner, nenhuma parede será alterada. Serão modificadas apenas as funções dos espaços internos. O local contará com sala de leitura, acervo físico e digital, anfiteatro, biblioteca, café e elevador para acesso de deficientes. “Será uma estrutura moderna, com tecnologia para atrair o público”, diz Wagner.

A edificação foi construída atendendo padrões estéticos e funcionais da época da concepção do projeto (década de 1920), adequado às famílias de alto poder aquisitivo. É farta em ornamentos, por dentro e por fora. A instalação da biblioteca exigiu alterações, preservando sua essência.

Segundo Maria Luiza Dutra, responsável pelo projeto de restauração, a maior dificuldade diz respeito às instalações elétricas, de prevenção e combate a incêndios, proteção patrimonial, ar-condicionado e acessibilidade. Esses itens têm de compatibilizar as normas atuais à preservação de pisos, forros e paredes decoradas.

“A maior parte das paredes das áreas sociais do térreo da antiga residência, assim como as dos halls do pavimento superior, tiveram suas pinturas decorativas preservadas, embora em condições não muito boas. Veja, não se trata de afrescos, mas de pinturas feitas à máscara com desenhos repetitivos. Todas as pinturas visíveis estão sendo mantidas. As que receberam pintura lisa e foram encobertas em tempos idos terão apenas um trecho à mostra, como testemunho de sua existência”, detalha Maria Luiza.

A nova edificação na área externa vai abrigar auditório e espaços para oficinas
Planta Biblioteca Altino Arantes

Um dos cuidados do projeto de ampliação foi o de garantir que o novo espaço tivesse altura inferior ao da casa projetada por Ramos de Azevedo. “O protagonista da obra é o prédio histórico”, reconhece o arquiteto Fábio de Bem, do escritório Pitá Arquitetura. O projeto também deu ênfase aos espaços internos e externos. “Até o mobiliário foi pensado para a valorização do todo e principalmente da história”, detalha Fábio.

Maquete mostra a integração da nova arquitetura ao projeto original de Ramos de Azevedo

Palacete Camilo de Mattos

Interior Palacete Camilo de Matto

Dezoito meses depois de toda a burocracia tramitar na prefeitura e nos órgãos de preservação do patrimônio, o Palacete Camilo de Mattos, também na Rua de Duque de Caxias, deverá renascer. O prédio foi adquirido em 2017 pelos empresários Ricardo Cesar Massaro e Marcos da Cunha Mattos – que não é descendente do ilustre morador original da casa, apesar da coincidência nos sobrenomes.

Joaquim Camilo de Moraes Mattos, que foi vereador e prefeito de Ribeirão Preto, além da intensa atividade empresarial e política no interior paulista, viveu naquela casa, um endereço privilegiado da elite cafeeira.

Os 1.100 m² do local têm 600 m² de área construída, com 19 cômodos, oito na parte superior e 11 no térreo, além de uma varanda. Nos fundos há uma casa de caseiro. “O palacete será restaurado como unidade unifamiliar, sem outra finalidade de uso, e seguindo sua originalidade”, explica o arquiteto e urbanista Claudio Bauso, responsável pela execução do projeto.

Planta do Palacete Camilo de Mattos

O objetivo dos empresários é dar nova utilização para o prédio e atrair pessoas para centro da cidade. Enquanto a obra não começa, a dificuldade é preservar o imóvel de invasões e depredações. “Temos frequentes ocorrências de pessoas que entram para furtar, dormir ou usufruir do local. Começamos a fazer o monitoramento por câmera para tentar evitar as invasões”, diz Ricardo.

Em junho deste ano, o Palacete foi aberto à visitação durante a Feira Nacional do Livro. “A população teve a oportunidade de conhecer um de seus patrimônios históricos, mostrando a função cultural e social do edifício”, ressalta Claudio. Para ele, o tombamento atribuiu ao imóvel valores artísticos, arquitetônicos e paisagísticos. “Ele participa da paisagem da cidade, portanto também tem uma tendência turística”, argumenta. Estão previstas visitas monitoradas ao Palacete durante a reforma.

A arquitetura do prédio é Art Déco, de origem francesa e eclética, com pinturas de afrescos (técnica de pintura em paredes) em estêncil (aplicação de tinta sobre um molde vazado). No seu interior foram utilizados materiais nobres, como mármore de Carrara e Peroba-rosa nas portas, janelas, caixilhos.

Segundo Claudio, a construção do Camilo de Mattos coincide com o período em que os casarões no centro eram projetados por grandes nomes da arquitetura. Neles, a arte do interior, sempre ricamente adornado, normalmente era executada por italianos, imigrantes que vieram para Ribeirão Preto para trabalhar no cafezal. Sem vocação para a lavoura, fixaram-se na cidade trabalhando como músicos, pintores, artistas de uma forma geral. “Os italianos deixaram um legado, uma contribuição muito grande na arquitetura e na arte das elites do período cafeeiro”, diz.

Claudio explica que o Palacete retrata as relações sociais, políticas, econômicas, trabalhistas e culturais de um período próspero. “Vemos uma relação trabalhista e social em espaços da casa para prestação de serviço interno que naquele momento eram importantes. Isso está na moradia, na forma de construção, como a disposição da casa do caseiro ao fundo e o quarto do casal à frente da casa, onde era possível manter o domínio dos movimentos da residência”, explica.

A Casa da Memória Italiana

Fachada

Com quase 100 anos de existência, a Casa da Memória Italiana, localizada na Rua Tibiriçá, no centro de Ribeirão Preto, é exemplo de preservação. O acervo composto pela estrutura arquitetônica, decorativa e mobiliária é original da década de 1920. “Piso, lustres, arandelas, pinturas artísticas das salas e quartos, vitrais e mobiliário são da época da construção”, conta Maria Augusta Scatena Lopes, neta de Pedro Biagi, o segundo e derradeiro proprietário do imóvel.

Maria Augusta morou na casa por muitos anos e hoje coordena o programa de zeladoria e segurança do Museu Casa da Memória Italiana. Para ela, a utilização da casa por famílias que viveram em épocas tão diferentes, sem a necessidade de adequação, só foi possível devido aos cuidados dos moradores.

A Casa foi projetada em 1923, pelo arquiteto Arnaldo Maia Lello a pedido de Joaquina Evarista Meirelles, fazendeira de café. A edificação foi denominada na planta como Bungalow, estilo de casa americana com influências do Art and Craft, movimento estético inglês que defende o artesanato criativo. Parte de sua ornamentação externa é considerada com estilo neocolonial simplificado, que surgiu em São Paulo no início do século XX.

Em 1941, a residência foi comprada pelo casal de imigrantes italianos Pedro Biagi e Eugenia Viel Biagi. A casa foi habitada por seus familiares até 2012. Em 2014, o imóvel foi doado ao Instituto Casa da Memória Italiana, criado com o intuito de documentar e preservar a história da imigração italiana.

O espaço mantém diversas ações educativas e culturais gratuitas. São realizadas palestras, contações de histórias, música e oficinas para família, exibição de filmes, exposições de arte e um concerto de final de ano apresentado no jardim da fachada da edificação.

“Todas as ações tem o objetivo de agregar a comunidade ao espaço histórico, promovendo experiências que fomentem o sentido do pertencimento ao Museu Casa da Memória Italiana como um lugar de memória da cidade e da sua própria vida”, destaca Alice Registro Fonseca, gestora executiva Casa da Memória Italiana.

Desafio da engenharia

Uma capela de 1920 foi erguida e sob ela será construído um complexo de entretenimento e lazer

Capela Santa Luzia

Uma antiga capela tombada pelo tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) ficou no meio do caminho de um ousado projeto na capital paulista. A solução foi erguê-la, usando a ciência que transforma e que também preserva: a engenharia.

A edificação, projetada pelo arquiteto italiano Giovanni Battista Bianchi e construída em 1922, foi suspensa a 31 metros do chão sobre uma plataforma de concreto e sustentada por pilares. A construção do complexo Cidade Matarazzo, projeto que compreende um hotel de luxo que será entregue em 2020 em São Paulo (SP), e integra a capela a um complexo hoteleiro, a Rosewood Hotels and Resorts.

Oito pilares de 54 metros de profundidade foram concretados sob o a edificação, que tem 1.600 toneladas. O terreno foi inteiramente removido para criar o vão necessário para oito andares de subsolo. A escavação das colunas foi feita com uma perfuratriz de baixa percussão e depois, com processos de hidrojateamento (utilização de jato de água de alta pressão), a terra sob o edifício foi cuidadosamente removida. O espaço abaixo da igreja será ocupado por um cinema, bicicletário, área de desembarque de passageiros e estacionamento.

Profissionais de Engenharia e Arquitetura falam sobre a preferência brasileira pela alvenaria convencional em contraponto à diversificação dos processos construtivos mundo afora

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Alvenaria convencional, estrutural, paredes de concreto, paredes de EPS e wood, steel frame ou light steel frames combinados a uma gama variada de materiais de vedação, como placas cimentícias, drywall, OSB, entre outros [veja Glossário]. São muitos e variados os tipos de sistemas e subsistemas de construção utilizados em obras mundo afora [leia ‘Definições sobre sistemas construtivos’ nesta reportagem], mas no Brasil prevalece a utilização de menos da metade deles, com vantagem disparada para a alvenaria.

De acordo com o engenheiro civil e professor universitário André Zanferdini, a escolha majoritária por construções de blocos e tijolos no país tem a ver com a não-necessidade de mão de obra especializada, relação custo-benefício e disponibilidade de materiais [a grande oferta resultando em preços mais competitivos em relação aos dos materiais alternativos], mas também com a “falta de iniciativa, de planejamento, cultura vernacular e tradição fincadas no sistema construtivo existente desde o Brasil colonial”.

Vale lembrar que, no contexto acadêmico da arquitetura e engenharia, o termo vernacular refere-se a processos construtivos mais “raiz”, nas palavras do arquiteto e também professor universitário Flávio Cesar Mirabelli Marchesoni, pois possuem uma forte influência da cultura local, apoiando-se em técnicas e no uso de materiais da região em que a obra está inserida. “São vistos como rústicos sob um olhar mais desavisado, mas na realidade são altamente sofisticados por serem o que melhor podem responder às condicionantes do clima, da disponibilidade de recursos e com enorme eficiência energética passiva (o que entendemos por resposta bioclimática)”, ensina Flávio.

Como o barro sempre foi abundante e de fácil extração em todo o mundo e mais ainda em um país continental como o Brasil, o tijolo de cerâmica passou a ser utilizado por aqui desde os primórdios da ocupação europeia, por volta do século 16 [leia mais em ‘Origem dos Tijolos’], o que confirma a “cultura vernacular e a tradição fincadas desde o Brasil colonial”.

Já a falta de iniciativa e planejamento para quebrar paradigmas sobre materiais alternativos são privilégios das últimas gerações mesmo, e seria reforçada pela desconfiança popular, na opinião do também engenheiro e professor universitário Ricardo Gomes. “É uma questão até bem engraçada. Tem pessoas que, quando vão comprar uma casa, uma das primeiras coisas que fazem é dar uns murros na parede para ver se é sólida. E quando você tem uma parede em gesso acartonado, você bate e sente que é oco, né? Mas isso não significa que não seja uma parede resistente. Esses materiais são muito testados contra impactos pela indústria antes de serem colocados como alternativas de vedação. Se você está decidido a abrir um buraco nelas, até vai conseguir, mas precisará bater muitas vezes com marreta, ou seja, será tão difícil de furar quanto uma parede de bloco cerâmico”, comenta.

De acordo com Ricardo, a resistência a materiais alternativos nem sempre sai barata. “A gente tem uma série de problemas no Brasil que vêm justamente dessa tradição, desse gosto mais arraigado por coisas mais artesanais e tudo o mais”, diz, citando como exemplo casos em que é utilizado fechamento de alvenaria para steel frame. “A alvenaria não é a melhor opção para estrutura de aço mais pesada. São materiais que trabalham de maneiras muito diferentes. Pegando só a questão da temperatura, esses materiais se dilatam de formas diferentes. Temos uma série de patologias de construção associadas a isso, como trincas e fissuras”, afirma. Segundo o engenheiro, já há um consenso em utilizar placas cimentícias do lado externo e, para o lado interno, placas de gesso acartonado ou OSB.

Processos construtivos
Para o arquiteto Flávio, entre as quatro formas existentes de se construir algo – entre as quais se inclui a vernacular, já citada –, a alvenaria convencional pertence à categoria mais ordinária ou comum, que ele considera não muito eficaz por muitas vezes envolver grandes desperdícios de material, de trabalho, resultando em baixa eficiência energética, sem muita consciência do que efetivamente se está fazendo. “É o caso clássico de se fazer toda uma parede de alvenaria e depois se rasgar ela toda para instalar tubulações e eletrodutos, deixando para traz remendos que exigirão argamassar tudo para esconder as cicatrizes”, exemplifica.

Segundo ele, a terceira forma é o processo racionalizado, que pode ter vários níveis: desde o mais óbvio, de se planejar algumas etapas para já receber as posteriores sem que haja um retrabalho, até o que já atinge o quarto nível, representado pelos processos industrializados. Neste, a racionalidade seria tão ampla que se passa a não mais construir no sentido clássico do termo, mas a “montar” a edificação usando componentes previamente prontos, bastando apenas uni-los no canteiro de obras. “É só procurar no youtube por ‘edifícios com a construção mais rápida do mundo’ para ver exemplos, como edificações de hotéis de 30 pavimentos que são construídos em 30 dias e entram em funcionamento. Dessa maneira, nos dois extremos, quer no processo construtivo vernacular, quer no industrializado, há grande desempenho”, afirma o arquiteto.

Definições sobre sistema construtivo
No âmbito da construção civil, o “sistema construtivo” de uma obra caracteriza-se por
um conjunto integrado de subsistemas: estrutural, de vedação, elétrico e hidráulico,
entre outros, que são projetados e executados de acordo com normas técnicas préestabelecidas pela ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas).
Tais normas estabelecem requisitos para os materiais, bem como para os procedimentos
de execução dos serviços de cada subsistema e, em especial, o atendimento aos
requisitos dos usuários do edifício quanto a seu comportamento em uso, isto é, seu
desempenho.

Esta reportagem aborda subsistemas de vedação — tecnicamente falando Sistema de
Vedação Vertical Interna e Externa (SVVIE), assim denominado na “ABNT NBR 15575-
4 Edificações habitacionais - Desempenho Parte 4: Sistemas de vedações verticais
internas e externas” —, definidas como partes da edificação habitacional que limitam
verticalmente a edificação e seus ambientes, como fachadas e as paredes ou divisórias
internas. Elas podem ser com ou sem função estrutural, comumente designadas como
alvenaria de vedação (convencional) e alvenaria estrutural, respectivamente.

O estrutural suporta cargas além do seu peso próprio, isto é, de laje, de pavimentos
superiores e/ou da cobertura. Como exemplos temos os sistemas construtivos citados
em alvenaria estrutural (armada ou não), o Wood Frame (estrutura de madeira) e o
Light Steel Frame (estrutura de aço leve).

Quanto ao subsistema de vedação, que suportam somente o próprio peso, ou seja,
servem só para vedar, separar e adequar ambientes, os sistemas construtivos podem
ser, entre outros, os citados em alvenaria de blocos e Drywall (gesso acartonado).

De uma maneira generalizada, tem-se três tipos de sistemas construtivos: o
tradicional, o racionalizado e o industrializado, que se diferenciam em relação
aos materiais, técnicas e tecnologia de execução, desempenho, prazos de execução,
custo, qualidade, uniformidade, entre outros aspectos.
FONTE: André Zanferdini, professor da faculdade de Engenharia Civil do Moura Lacerda

De acordo com Flávio, mundialmente, há hoje uma maneira genérica de se edificar que está mais intimamente vinculada à complexidade de industrialização dos componentes utilizados na construção que cada país tem do que baseada nas suas raízes culturais locais. “Países mais industrializados têm como tendência usar sistemas estruturais desvinculados dos seus fechamentos, constituídos muitas vezes com painéis, relegando a alvenaria a um segundo plano, pois esta exige um consumo de materiais maior, mão de obra maior, mais tempo de execução... cada vez mais incompatível com qualquer lugar desenvolvido no mundo”, diz, numa crítica implícita à alvenaria convencional.

Também na opinião do engenheiro André Zanferdini a construção civil brasileira poderia muito bem se beneficiar de sistemas alternativos numa escala maior que a de hoje, incluindo elementos pré-moldados e light steel frame “em tudo o que se referir à construção industrializada”. No que compete aos poderes constituídos, os governos poderiam, segundo ele, contratar projetos, na forma de concurso, que contemplem outros sistemas e materiais. “Quanto à iniciativa privada, a questão é determinada pelo projetista de arquitetura e/ou de engenharia, a quem cabe a definição dos sistemas e a especificação dos materiais, muito embora, em alguns casos, o mesmo terá de exercer seu poder de convencimento junto ao cliente ou proprietário. E em ambos os casos, qualquer iniciativa deve ser realizada por quem tenha o domínio tecnológico sobre esses sistemas e materiais alternativos”, conclui.

Mas Zanferdini alerta que, tendo em vista a existência de uma “interdependência entre alguns subsistemas da construção, a viabilidade técnica e econômica para a escolha de um sistema construtivo alternativo ou inovador torna-se complexa”. Por isso exige uma análise completa, considerando custo, estanqueidade, desempenho térmico, desempenho acústico, durabilidade, impacto ambiental, etc, e envolvendo todos os subsistemas da obra em referência. “Se não for assim, um sistema construtivo alternativo ou inovador pode proporcionar uma redução de custo em determinado subsistema e encarecer muito mais em outros. Por fim – e muito importante! – não se deve esquecer a análise da percepção dos moradores sobre o uso dos sistemas construtivos inovadores”, declara.

Parâmetros de escolha
Na prática, atualmente quatro critérios principais norteiam a escolha de qual sistema será usado numa obra, de acordo com Ricardo Gomes: custo, tempo de execução, função da obra e – mais recentemente – sustentabilidade.

O custo é afetado pela relação de oferta e procura dos materiais no mercado. Por exemplo, no Brasil, a preferência pela alvenaria torna a produção de blocos e tijolos de cerâmica economicamente atraente, levando muitas pessoas a investir no negócio. “Com muita oferta, os preços desses materiais ficam muito mais competitivos que os dos materiais mais alternativos com pouca procura no país”, pontua Ricardo.

O tempo é o de duração da obra, que pode afetar ou ser afetado pela escolha do sistema construtivo. Para exemplificar como o uso dos materiais para a vedação pode afetar o tempo de obra, Ricardo compara o de construção de uma casa padrão em alvenaria com cerca de 150 m², no Brasil de hoje, com a do famoso edifício de mais de 100 andares, Empire State Building (Nova York - EUA), em 1930, que utilizou estruturas de aço e placas cimentícias: pouco mais de um ano em ambos os casos.

E para ilustrar como o tempo pode influenciar o custo, o engenheiro cita a obra de um edifício de 57 andares, na China, cuja evolução foi filmada em time lapse e o vídeo postado na plataforma Youtube. Tudo o que foi utilizado de estrutura no edifício – estruturas metálicas, placas de vedação e até a laje seca – foi fabricado antes em uma indústria, já com as tubulações de ar-condicionado, esgoto, água e eletricidade embutidas com precisão milimétrica. No canteiro de obras, tudo foi encaixado, parafusado, soldado e rebitado. Feitas as ligações e dados os toques finais nos acabamentos, o edifício todo ficou pronto em apenas 19 dias.

Para Ricardo, o custo de fabricação das estruturas, vedações e outros materiais do edifício chinês pode ter ficado muito mais alto que o de um equivalente em alvenaria, que levaria muitas vezes esse tempo de duração, mas o custo da mão de obra, paga em horas de trabalho, deve ter resultado bem menor.

O engenheiro usa a mesma obra como exemplo de outro parâmetro citado como norteador das escolhas de sistemas construtivos: sustentabilidade. “Em um edifício no qual todas as estruturas chegam praticamente prontas para serem encaixadas eu não vou ter resíduos, porque a fábrica já terá feito tudo da maneira mais eficiente, desperdiçando o mínimo possível de material. O canteiro resulta limpo e organizado”, comenta.

A sustentabilidade, aliás, é o grande ponto a favor dos sistemas chamados “secos”, que eliminam a necessidade de misturas de cimento, areia e outros materiais com água nos canteiros de obras, caso dos wood e steel frames e dos blocos de gesso ligados com gesso-cola, por exemplo.

Por fim, o parâmetro “função” (define se a obra servirá para abrigar residência, alguma atividade, comercial, industrial ou de prestação de serviços, entre outras) pode influenciar a escolha do sistema por diferentes motivos. Por exemplo, se uma pessoa física não reúne condições financeiras de comprar todo o material da obra no mínimo tempo requerido, pode fazê-lo aos poucos, conforme o avanço da obra em alvenaria, que deverá seguir lenta. Já se uma pessoa jurídica tem pressa em erguer o edifício que abrigará sua atividade econômica, pode preferir o combo estrutura/vedações pré-moldadas. No Brasil, por motivos já elencados, esses sistemas podem sair mais caros que os de um edifício equivalente em alvenaria, mesmo considerando gastos menores com tempo de mão de obra, mas em outros países isso não acontece.

Escolhas pelo mundo
Ao contrário do Brasil, nos Estados Unidos os subsistemas de construção a prevalecerem nas unidades menor do que no caso de casas construídas com paredes mais leves e flexíveis?”, provoca Ricardo.

Sobre a origem dos tijolos
Observar a modificação de consistência do barro, que endurecia sob altas temperaturas,
levou à descoberta da cerâmica pelas antigas civilizações. Inicialmente, as cidades
foram construídas com tijolos de argila crua secos ao sol e, posteriormente,
queimados em fornos, o que transformava a terra crua em material cerâmico.

Os vestígios mais antigos da utilização de cerâmica em abrigos humanos datam de
7500 a.C, no Oriente Médio. A História conta que o tijolo de cerâmica é utilizado
desde 4.000 a.C. Por séculos as civilizações utilizaram o material para erguer
edifícios resistentes à temperatura e à umidade.

Depois que a Revolução Industrial trouxe a produção de blocos cerâmicos em grande
escala, o uso dos tijolos passou a ser aplicado na Europa e em todo o mundo. No
Brasil, é utilizado desde os primórdios de sua ocupação europeia, por volta do século
16, tendo sido Salvador e Recife as principais cidades a utilizarem o material.

Entretanto, o material cerâmico tornou-se essencial no país a partir de 1850,
revelando-se como elemento principal no sistema construtivo brasileiro, especialmente
nas últimas décadas do século 19 e no início do século 20. Naquele período, porém,
dividiu as funções estruturais com a pedra, fato notável em diversas construções
remanescentes no país.
Até hoje a cerâmica é um dos materiais mais usados na construção civil mundo afora.
FONTE: https://princesa.ind.br/tijolos-de-ceramica-tradicao-e-historia-na-construcao-civil/

Por isso é que, segundo ele, é comum se encontrar esse tipo de vedação em outros países sujeitos a abalos sísmicos, como o Japão, que tem também uma frequência grande de terremotos, como até o Chile, em plena América do Sul. “No Japão eles têm um apelo muito forte para as construções que utilizam wood frame, mas com técnicas diversas das dos Estados Unidos. Então pode ser uma estrutura de madeira com fechamentos bem diferentes, como películas que são quase um papel transparente, que às vezes vemos em filmes”, comenta o engenheiro.

Na China e por todo o continente asiático não prevalece, como no Brasil, preferência por um ou outro sistema, de acordo com Ricardo. Aliás, em nenhum outro país do mundo, ao menos não na proporção da que ocorre no Brasil na preferência pela alvenaria convencional. “Hoje em dia não se pode dizer que em um continente está sendo mais utilizado um ou outro sistema construtivo, principalmente quando se trata de Europa, porque existe uma diversidade de países com uma gama absurda de sistemas diferentes. Em termos de mundo, a gente tem até casas sendo impressas em impressoras 3D”, afirma.

Ainda falando em Europa, um continente repleto de patrimônios turísticos e culturais seculares, Ricardo lembra que em determinadas regiões, até por questões de preservação, seria um contrassenso usar wood e steel frames. Nesses casos, normalmente os sistemas construtivos seguem a tradição vernacular.

Glossário
EPS (Expanded PolyStyrene): sigla internacional do Poliestireno Expandido, polímero [veja matéria a respeito nesta edição] mais conhecido no Brasil pela marca “Isopor”;

Wood frame: ‘travessas de madeira’ em tradução livre, denomina sistema de construção constituído por perfis de madeira que, em conjunto com placas de diferentes materiais, formam paineis estruturais capazes de resistir às cargas verticais (telhados e pavimentos) e perpendiculares (ventos);

Steel Frame: ‘travessas de aço’, em inglês, denomina sistema construtivo a seco feito com perfis de aço galvanizado. Seu fechamento é realizado com placas de diversos materiais, dispensando o uso de tijolos, cimento e concreto;

Light steel frame: steel frame com liga metálica mais leve;

Drywall: em inglês ‘parede seca’, denomina placas de gesso acartonado, que costumam revestir estruturas de wood, steel ou light steel frames.

OSB (Oriented Strand Board): o significado da sigla, em inglês, é ‘painel de tiras de madeira orientada’, em tradução livre. O composto de raspas e tiras de madeira de reflorestamento organizadas na mesma direção e ligadas com resina resulta em placas resistentes, estáveis e versáteis para uso na construção civil;

Espuma expansiva de poliuretano (PU): material selante e adesivo que preenche espaços e possui ótima aderência em madeiras, alvenarias, metais, plásticos, sendo especialmente indicado para fixação de batentes, portas, janelas, entre outras superfícies, mas também pode ser usada como preenchimento de vedações em construções que demandam grande isolamento térmico e/ou acústico.

O material está presente na maioria dos sistemas construtivos tradicionais mais usados na construção civil brasileira

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Desde que o inglês Joseph Aspdin inventou o cimento, em 1824, a construção civil nunca mais prescindiu do material [leia “A pré-História do Cimento”]. Formado por substâncias calcárias e argilosas aquecidas em forno a 1.500 graus Celsius, hoje o pó de cimento é usado em todos os métodos tradicionais de construção, seja para consolidação de concretos, no assentamento de blocos ou na elaboração de massa para reboco.

O desenvolvimento de novas tecnologias para a construção civil já concebe construções com materiais alternativos que dispensam o cimento, como as casas de gesso erguidas com blocos feitos desse material milenar [leia reportagem na sequência], mas ainda são tendências a serem consolidadas pelo mercado. Até que isso aconteça, seguem imperando na construção civil brasileira os sistemas construtivos convencionais.

Os cinco mais conhecidos são alvenaria de vedação ou convencional, alvenaria estrutural, steel frame (metal e gesso), wood frame (madeira) e paredes de concreto. Não existe um melhor que outro, mas o que mais se adequa a cada tipo de edificação. Cabe ao engenheiro responsável por cada projeto analisar o desempenho de cada um, a mão de obra disponível na região, a durabilidade do sistema construtivo, o objetivo e a função da construção antes de decidir pelo mais adequado.

PRÉ-HISTÓRIA DO CIMENTO
Os primeiros materiais ligantes usados em construções humanas datam de 15 mil anos atrás – idos dos períodos Paleolítico e Neolítico –, quando o homem começou a erguer suas primeiras habitações com pedras encaixadas, madeira ou adobe (tijolo de barro seco ao sol). Só cerca de 5 mil anos depois seu crescente sedentarismo o levou a obter um pó ligante a partir do aquecimento de pedras de calcário e gesso.

Na Antiguidade surgiram novas alternativas, como o betume (tipo de asfalto), que foi aplicado nos jardins suspensos da Babilônia. Um pouco mais tarde, os romanos descobriram a pozzolana (cinzas típicas de arredores de vulcões misturadas a cal), que foi usada, por exemplo, na construção do Coliseu. Eles viriam a descobrir também, no século 2, o opus caementicum, uma argamassa à base de mármore, tijolo e rochas vulcânicas com a qual construíram o Panteão.

As pesquisas mais importantes acerca de materiais ligantes ressurgiram apenas no século 18. Entre elas, a do inglês John Smeaton, que em 1786 descobriu uma massa resistente a partir do aquecimento de calcários moles e argilosos a temperaturas de até 800 graus Celsius. Em 1818, o francês Vicat obteve resultados semelhantes com a mistura de componentes argilosos e calcários.

Em 1824, Joseph Aspdin aumentou ainda mais a temperatura do seu forno para aquecer calcário e argila em pó. Obteve uma mistura que, após receber água e deixada para secar, ficava dura como pedra. Era o cimento portland que conhecemos hoje – batizado assim pela semelhança com as pedras da ilha de Portland, na Inglaterra.

PRINCIPAIS TIPOS DE SISTEMAS CONSTRUTIVOS

ALVENARIA DE VEDAÇÃO OU CONVENCIONAL
A sustentação da estrutura dessas edificações é feita por vigas, pilares e lajes de concreto armado, e a alvenaria usada nas paredes serve apenas para vedar e separar os ambientes. Para isso são utilizados os blocos cerâmicos.

É o sistema mais utilizado no Brasil por dispensar mão de obra qualificada e especializada.

VANTAGENS
1. Suporta grandes vãos;
2. Grande disponibilidade de mão de obra e materiais;
3.  Pouca exigência de qualificação da mão de obra;
4. Facilita futuras reformas e mudanças no projeto.

DESVANTAGENS
1. Maior custo;
2. Maior tempo de execução;
3.  Gera muitos resíduos.

ALVENARIA ESTRUTURAL
É aquela que une a estrutura e a vedação da edificação utilizando blocos cerâmicos ou de concreto específicos para este fim. As paredes estruturais sustentam a edificação, por isso não podem ser derrubadas sem uma avaliação profissional prévia dos projetos de construção. Aliás, o projeto de alvenaria deve ser muito bem detalhado e já compatibilizado com os projetos elétrico e hidrossanitário - os vãos da edificação devem ser definidos de acordo com a modulação do bloco a ser utilizado.

Demanda mão de obra mais especializada, porque, se as paredes não ficarem niveladas e no prumo, podem ocorrer acidentes. E em edificações com mais de quatro pavimentos deve-se utilizar barras de aço junto com os blocos de alvenaria estrutural.

VANTAGENS
1. Rapidez e facilidade de construção;
2. Redução da mão de obra;
3. Maior economia;
4. Maior qualidade na execução;
5. Menor desperdício de materiais.

DESVANTAGENS
1. As paredes não podem ser removidas sem recolocar um elemento estrutural para suprir as cargas;
2. Limitações estéticas nos projetos arquitetônicos;
3. Vãos livres limitados

STEEL FRAME
É um sistema industrializado e racionalizado. A estrutura é formada por perfis de aço galvanizado e seu fechamento feito com placas cimentícias de madeira ou drywall (gesso). A principal diferença do steel frame para os outros sistemas é a limpeza do canteiro de obras, pois a geração de resíduos é mínima e não há necessidade do uso de água.

VANTAGENS

  1. Agilidade na construção;
    2. Redução do peso da estrutura;
    3. Maior precisão na execução;
    4. Melhor isolamento térmico e acústico;
    5. Menor custo.

DESVANTAGENS
1. Limite de pavimentos;
2. Dificuldade de encontrar mão de obra especializada.

AME
Muito parecido com o steel frame, com a diferença de que leva perfis de madeira - normalmente de reflorestamento, como o pinus - em vez dos de aço galvanizado. Os perfis são de madeira maciça, contraventados com chapas de OSB e estrutura de madeira autoclavada com a função de proteger a edificação de cupins e umidade.

VANTAGENS
1. Canteiro de obras organizado e limpo;
2. Uso de madeira de reflorestamento, única matéria prima renovável da construção civil;
3. Ótimo desempenho acústico e térmico;
4. Agilidade na construção;
 5. Redução de geração de resíduos;
6. Baixo custo.

DESVANTAGENS
1. Mão de obra especializada;
2. Limites de pavimentos;
3. Maiores cuidados com impermeabilização

PAREDES DE CONCRETO
Usa paredes estruturais maciças de concreto armado, que são concretadas com o auxílio de formas de madeira ou metálicas montadas na obra, de acordo com o projeto arquitetônico.

As instalações hidráulicas e elétricas são embutidas, então não há quebra de paredes e retrabalhos. É mais viável para construções de larga escala, em que as formas serão reutilizadas várias vezes, já que seu custo é alto.

VANTAGENS
1. Alta produtividade;
2. Alta resistência ao fogo;
3. Pouco desperdício de materiais.

DESVANTAGENS
1. Baixa flexibilidade;
2. Não tem bom isolamento térmico e acústico;
3. Devido ao uso de formas, tem alto custo para produção em pequena escala.

Após quase acabar em 2008, fungicultura brasileira vive fase de crescimento alavancado por pequenos e médios produtores, que apostam no produto fresco para driblar a concorrência

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Consumidos como alimentos desde a pré-história e descobertos como medicamentos há cerca de dois mil anos, os cogumelos são consumidos assiduamente por asiáticos e europeus há séculos, mas, no Brasil, seu cultivo é relativamente recente. Começou comercialmente na década de 1950, com a chegada de imigrantes japoneses e chineses e permaneceu pequeno até a primeira década deste século. Tanto que não há números confiáveis sobre a produção do período – um dos dados oficiais mais antigos, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), aponta que, até 1996, os brasileiros consumiam uma média de 30 gramas de cogumelos ao ano por pessoa, o que, comparado aos 2 kg por cabeça/ano consumidos na Europa, era considerado extremamente baixo.

Desde a Pré-História
Os cogumelos foram, provavelmente, um dos primeiros alimentos colhidos pelos povos pré-históricos. Na antiguidade, eram servidos pelos egípcios aos faraós como iguarias e, pelos romanos e gregos, como alimento principal em suas famosas orgias.

O uso de fungos em terapias medicinais vem de tradições milenares. Provavelmente, as primeiras reproduções de fungos conhecidas pelo homem, datando de 3.000 anos, referem-se às famosas “pedras de cogumelos” da Guatemala, onde eram usados em rituais místicos e medicinais.

No primeiro livro chinês sobre substâncias medicinais, o Shen Nung’s Herbal, escrito há mais de 2.000 anos, encontram-se registros dos efeitos benéficos de vários fungos. O Lingzhi (cogumelo do gênero Anodermas) era usado pelas cortes imperiais da China como Elixir da Vida, Deus da Longevidade. Não sendo comestível, pode-se inferir que seu uso estava associado às suas propriedades medicinais ou tônicas.

Os cogumelos foram também mencionados por grandes escritores gregos e romanos – entre os quais Hipócrates, o pai da medicina, no século IV a. C..

Na era contemporânea, o interesse pelas propriedades tônicas ou medicinais dos cogumelos aumentou enormemente a partir da década de 1970. Desde então, as pesquisas para validar suas propriedades medicinais, bem como determinar a natureza da ação dos compostos biologicamente ativos, tiveram um grande impulso, acarretando uma maior comercialização de seus produtos. Inúmeras substâncias com atividades terapêuticas têm sido isoladas e caracterizadas.

No Brasil, há relatos, de que os grupos indígenas Sanema e Yanomami, na Amazônia, são consumidores, há gerações, de uma grande variedade de cogumelos.

A partir de 2008, porém, a fungicultura brasileira entrou em uma espiral ascendente que culmina, hoje, na produção estimada em 12 mil toneladas ao ano, para um consumo de 150g per capita/ano, segundo o engenheiro agrônomo Daniel Gomes, pesquisador especialista em engenharia agrícola e pós-colheita da Agência Paulista de Técnica Agrícola (APTA) e ex-presidente da Associação Nacional de Produtores de Cogumelos (ANPC). “E a gente está seguro pra falar que temos mais de 1.000 produtores [em todo o país]”, comemora.

Várias mudanças de hábitos dos brasileiros contribuíram para a guinada na produção da cultura: aumentos na oferta de restaurantes de culinária asiática (“só na cidade de São Paulo tem mais restaurante japonês do que pizzaria”, afirma Daniel) e da consciência ambiental (cogumelos são decompositores de matéria orgânica na natureza e seu cultivo pode ser 100% sustentável); e buscas por uma alimentação mais saudável (várias espécies têm propriedades nutracêuticas, ou seja, altamente nutritivas e medicinais) e cardápios mais gourmet. “Cogumelo é tudo de bom. É saudável, gostoso, vistoso, diferente e versátil. Com ele se faz carpaccio, macarrão, pode ser assado, posto na churrasqueira... até sobremesa de cogumelo a gente tem. Essa versatilidade vem caindo no gosto do consumidor brasileiro”, enaltece Daniel.

SETE VERDADES SOBRE OS FUNGOS

- Na natureza existe o Reino Vegetal, o Animal e o Reino dos Fungos.
Sim! Apesar de apresentarem estrutura muito simples, sem a presença de folhas, raízes, caules, sementes e flores, esses organismos possuem peculiaridades próprias e distintas o suficiente para justificar sua colocação em um reino separado.

- Todos os cogumelos são fungos, mas nem todos os fungos são cogumelos.
Definidos pelo renomado cientista chinês Shu-Ting Chang como “macrofungos com corpos de frutificação característicos grandes o suficiente para serem visíveis a olho nu e coletados com as mãos”, podem ser formados acima (epígeos) ou abaixo do solo (hipógeos), como as trufas.

- Do ponto de vista metabólico, os cogumelos estão mais próximos dos animais e, quanto à reprodução, dos vegetais.
Apesar de se assemelharem às plantas, carecem de cloroplastos, por isso são incapazes de sintetizar o próprio alimento através da fotossíntese. Portanto, são heterotróficos, requerendo compostos orgânicos pré-formados como fonte de energia, obtidas por absorção.

- ‘Existe a fauna, a flora e a funga, sustentando tudo para as duas primeiras’.
Assim o biólogo Guilherme Aranha descreve o papel essencial dos fungos como decompositores da matéria orgânica.

- São altamente nutritivos e funcionais
Estudos científicos têm comprovado que os cogumelos comestíveis e/ou medicinais fornecem proteína de alta qualidade, que pode ser produzida com maior eficiência biológica em relação à animal. São ricos em fibra, minerais e vitaminas e apresentam baixo teor de gordura total, com uma alta proporção de ácidos graxos poliinsaturados.

- NÃO substituem a carne
Por serem muito fibrosos, os cogumelos promovem muita saciedade, mas nem de perto se igualam à carne do ponto de vista nutricional. 100g de cogumelos frescos possuem apenas 3% de proteínas, enquanto a mesma quantidade de carne bovina, por exemplo, possui 26%, em média. O cogumelo só vira referência de proteína vegetal quando desidratado, porque então seu percentual desse nutriente sobe para uma média de 30% em 100g de massa.

- São umamis
Os cogumelos em geral são muito ricos no aminoácido glutamato, responsável pelo chamado quinto sabor - nosso paladar sente o ácido, o doce, o amargo, o salgado e o umami (termo de origem japonesa que significa ‘saboroso e agradável’).
Fonte: https://www.anpccogumelos.org/cogumelos e biólogo Guilherme Aranha

SEGMENTAÇÃO
Nenhuma mudança de hábito teria adiantado, porém, se a cadeia produtiva da fungicultura não tivesse se reestruturado após quase acabar, em 2008, quando a queda da Lei antidumping propiciou a entrada no país de cogumelos em conserva importados por até ¼ dos preços dos produzidos por aqui.

O setor era, à época, quase exclusivamente dedicado ao “cogumelo de Paris” ou champignon, destinado à indústria, onde era pré-cozido e envasado em conserva para venda em prateleiras de supermercados e afins. “Essa variedade é sensível a temperaturas mais altas [as ideais ficam entre 15°C e 24°C], fazendo com que os cogumelos importados da China ocupassem quase todo o mercado brasileiro”, lembra a Embrapa em artigo sobre a cultura.

“Sofremos quase uma derrocada da cadeia produtiva de cogumelos [com a lei antidumping de 2008], que já era pequena, mas nessa mesma época ela começou a se transformar”, por Daniel. E essa transformação implicou, segundo ele, uma segmentação na cadeia, que gerou mais empregos e oportunidades de trabalho, com o empreendedor podendo escolher qual etapa lhe é mais favorável para investir. “Antigamente, quem produzia cogumelos eram produtores amadores que tinham de entender do ciclo todo de produção. Hoje em dia, a cadeia está se especializando e segmentando: tem o indivíduo que faz a semente, outro que faz o composto, os cultivadores (a maioria compra o composto pronto e inoculado com a semente para produzir na sua estufa) e a cadeia de ponta, que são os distribuidores”, esclarece o engenheiro agrônomo.

O Brasil ainda importa, hoje, cerca de 12 mil toneladas de cogumelos em conserva, mas os produtores que permanecem na cultura souberam encontrar formas de driblar essa concorrência. Segundo a APTA, “muitos focaram seus esforços na produção e comercialização de cogumelos frescos para se manterem na atividade”, já que o produto in natura possui uma série de vantagens em relação aos comercializados em conserva. Daniel Gomes confirma que a aposta, aceita por muitos pequenos e médios produtores, causou um rápido desenvolvimento da fungicultura.

Para ele, o consumidor também saiu ganhando com a reestruturação da cadeia, porque isso levou a uma diversificação das espécies cultivadas no Brasil. “Saímos de um produto processado e cozido, em conserva, para uma gama de sabores, tamanhos e cores de cogumelos. Hoje a gente tem uns 20 tipos disponíveis. Entre eles shimejis branco, preto, cinza e salmão, shitake, pering enoch, portobelo e até trufa brasileira. A fungicultura nacional deu um up”, arremata o engenheiro agrônomo.

Desde o início da produção brasileira, São Paulo segue como maior estado produtor e consumidor de cogumelos. Segundo dados da Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento, em 2019 havia um total de 505 produtores distribuídos por 93 municípios paulistas.

De acordo com Daniel Gomes, a maior parte da cadeia produtora fica na região de Mogi das Cruzes, abrangendo Bragantina e Sorocaba, mas ele enxerga um mercado nascente e promissor na de Ribeirão Preto, do qual participam a Cog & Co e a Cogumelos Terra Roxa.

Sediada na Fazenda Santa Eulália, em São Simão – região metropolitana de Ribeirão – a Cog Cogumelos é dirigida, desde 2019, pelos sócios Guilherme Colucci Rodrigues da Silva, publicitário, e Carlos Eduardo Pizeta, internacionalista.

É Guilherme quem conta que ambos eram sócios em outro negócio de distribuição de café especial, na capital paulista. Quando, em 2018, voltaram para a terra natal por conta de questões familiares, desfizeram a sociedade com um terceiro parceiro e começaram a pensar em iniciar outro empreendimento juntos. Como ambos são vegetarianos e apaixonados por comida japonesa, o cultivo de cogumelos surgiu como uma opção atraente.

ESPÉCIES MAIS CULTIVADAS

Champignon de Paris (Agaricus bisporus)
- Mais cultivado no mundo (38% da produção global) e no Brasil (66% do total in natura). É cultivado em um composto orgânico que levar palhas de cereais, gramíneas, bagaço de cana e esterco animal. As principais regiões produtoras são Europa, América do Norte, China e Austrália.

Cogumelo Ostra e variedades de Shimeji (Pleurotus spp.)
- Ocupam a segunda posição na produção mundial (25%) e também no Brasil (16% do total in natura) Dentro do gênero Pleurotus são cultivadas várias espécies - incluem o Pleurotus ostreatus (shimeji branco e shimeji preto), Pleurotus djamor ou Pleurotus ostreatoroseus, Pleurotus eryngii, Pleurotus pulmonarius e Pleurotus citrinopileatus - em uma ampla gama de resíduos orgânicos (palha de cereais, serragem, bagaço de cana, resíduos de algodão) em sacos plásticos ou garrafas.

Shiitake ou Cogumelo do Carvalho (Lentinula edodes)
- Representa 10% da produção mundial e 12% da produção de cogumelos in natura no Brasil. Amplamente produzido no Japão, China e Coréia.

Champignon do Brasil ou Cogumelo do Sol (Agaricus blazei)
Mundialmente apreciado por suas qualidades gastronômicas e especialmente pelas propriedades medicinais, também é conhecido como Cogumelo Medicinal, Royal Sun Agaricus, The Brazilian Medicinal Mushroom e, no Japão, Himematsutake. Descoberto na região de Piedade, estado de São Paulo, em meados da década de 1960, foi enviado ao Japão para vários estudos, que relataram suas propriedades medicinais. Classificado inicialmente pelo taxonomista belga Paul Heinemann como Agaricus blazei Murrill, teve sua nomenclatura revisada a partir de 2002, mas ainda não há um consenso entre os especialistas a este respeito, de modo que é referido na literatura mundial como Agaricus blazei, Agaricus brasiliensis e Agaricus subrufescens. Algumas publicações brasileiras sobre suas propriedades medicinais referem-se ainda ao cogumelo como pertencente à espécie Agaricus sylvaticus.

Nem por isso a dupla se intimidou. Suas pesquisas constataram a existência de grandes produtores de cogumelos pré-cozidos em conserva no Brasil. “Mas a gente queria algo que chegasse direto da produção para a mesa do consumidor da região. Começamos a pesquisar materiais e vimos que havia espaço para a fungicultura crescer no Brasil como ramo de negócio”, comenta Guilherme

Decididos a investir, os sócios fizeram curso sobre a cultura no Sindicato Rural de Mogi das Cruzes e contrataram uma consultoria com o pessoal de lá, que foi até a fazenda orientá-los.

Desde o início, os sócios fizeram questão de que a atividade fosse focada na sustentabilidade. “Todos os materiais que utilizamos são biodegradáveis ou reutilizáveis”, afirma Guilherme. O cultivo ocorre em estruturas de alvenaria, dentro de galpões fechados, monitorados por equipamentos que ligam automaticamente quando os níveis de temperatura e umidade saem dos ideais. “Não é uma atividade simples. Tem que seguir alguns parâmetros”, comenta.

A produção começou pelo cogumelo shimeji, a variedade mais fácil de ser cultivada. Em menos de seis meses, porém, já eram 15, entre elas shitake, castanha, eringui, houbitake, reishii, mágico, cauda de perú, juba-de-leão, além de diferentes tipos de shimeji (premium, branco, preto, cinza, amarelo, salmão ou rosa, europeu e bunapi).

Com o tempo, os sócios começaram a diversificar também na oferta do produto, com o objetivo de expandir a clientela. Hoje, além do cogumelo in natura, vendido só na região por conta do curto prazo de validade (dez dias, o que obriga à colheita, no máximo, um dia antes da entrega), a Cog também comercializa kits de cultivo e cogumelos desidratados, que, por durarem mais, podem ser entregues para todo o Brasil via Correios. Um destaque dessa linha é o cogumelo juba-de-leão, de propriedades medicinais, que é desidratado e transformado em suplemento alimentar. “Fomos os primeiros a produzir a variedade na região”, pontua Guilherme.

Somadas todas as espécies cultivadas na Fazenda Santa Eulália, a produção atual da Cog & Co fica entre 350 e 400 quilos de cogumelos ao mês, dos quais 150 kg ficam entre Ribeirão Preto e Cravinhos, principalmente em restaurantes de culinária asiática.

Ainda é pouco para Guilherme e Carlos, que trabalham com a meta de atingir, até o final de 2022, o máximo de sua capacidade de produção: 1 tonelada/mês.

Os sócios não falam em cifras, mas garantem que o valor agregado da cultura tem compensado, o que pode atrair ainda muitos investimentos para o setor. “Produtor de cogumelo vai ter muito no Brasil daqui a pouco”, prevê Guilherme Colucci.

TERRA ROXA
 Prestes a se formar em Ciências Biológicas e sócio do biólogo Gustavo Alcântara na Cogumelos Terra Roxa, Guilherme Mauro Aranha concorda que a cadeia da fungicultura está se desenvolvendo de modo acelerado no Brasil, com muita gente querendo consumir, um pouco menos querendo produzir e menos ainda trabalhando com insumos para a produção. Por isso ele chama a atenção para um gargalo que, ao mesmo tempo, representa uma oportunidade de investimento no setor. “Quanto mais produtor tiver, mais insumo será necessário. Mas essa parte da cadeia ainda é muito restrita no Brasil, ou seja, não existe um mercado de insumos voltado especificamente para a cadeia fungícola. A gente ainda usa gambiarras para adaptar”, alerta, lançando mão de um ditado do mundo empresarial para reforçar o apelo: “quando está tendo uma corrida do ouro, é interessante você vender a pá”.

Aranha também sente falta de informações confiáveis sobre o setor. “Precisamos de mais ciência na fungicultura brasileira. O que acontece, muitas vezes, é de produtores opera rem no ‘achismo’ e não baseados em dados. E é muito importante coletar e ter informações, porque cada custo que se deixa de prever pode ser um grande rombo no orçamento”, frisa.

Com sedes em Tanabi e Cravinhos, a Cogumelos Terra Roxa começou em 2017, como um projeto de um grupo de amigos muito conectados a conceitos de educação ambiental e alimentação saudável. Foram atraídos pelo fato de os cogumelos serem recicladores naturais da natureza.

O projeto começou produzindo menos de 50 kg/mês. Hoje tocado só por Gustavo e Guilherme, opera na capacidade máxima, com produção de 120 kg/mês, das espécies shimeji branco (pleurotus ostreatus) e shimeji salmão (pleurotus djamor), em estufas que totalizam 24 m². “São fungos que crescem muito rápido. Têm uma produtividade alta porque o ciclo de vida deles é curto. E a verticalização do cultivo possibilita produzir aproximadamente 6 kg por m²”, explica o produtor.

Cerca de 90% dessa produção é fornecida in natura para Ribeirão Preto - uma pequena parte chega a Jardinópolis e Cravinhos. Os 10% restantes são refogados com outros ingredientes e prensados na forma de hambúrgueres, também vendidos pela região.

Os clientes são desde restaurantes e mercados a consumidores finais, que também podem comprar direto no site da Cogumelos Terra Roxa na internet. “Quando se produz em escala pequena como nós não pode se dar ao luxo de vender no atacado. Isso envolve posicionamento de mercado e relacionamento com o cliente. Funciona quando agregamos valor ao produto, porque não precisamos ficar brigando no preço com os grandes, que vendem o cogumelo processado produzido a quilômetros de distância”, explica Guilherme Aranha.

Segundo ele, o negócio nunca teve dívidas. Desde o início os sócios conseguiram pagar contas, ter caixa e um pouco de retorno do investimento inicial, mas, no tocante às horas de trabalho, a conta ainda não fecha. “Nosso pro labore ainda não paga o tempo que dedicamos ao negócio, mas isso era previsto. Fizemos um planejamento complexo. Aliás, tem que ter um plano de negócios muito bem feitinho antes de começar, porque demora um pouco pra chegar ao lucro. E esse plano tem que prever o ciclo de vida dos cogumelos, que se dá em fluxos. Ou seja, não é como um negócio tradicional”, alerta o produtor.

Mas os sócios não têm do que reclamar. “Com a produção atual a gente já consegue ter um lucro de mais de 50% sobre o custo de produção, que fica entre R$ 12 e R$ 14 por quilo”, conclui Guilherme Aranha.

Solo, clima e pesquisas científicas colocam o estado de São Paulo no topo da lista dos produtores de borracha do país; a variedade da planta mais usada aqui, entretanto, foi desenvolvida na Malásia

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Seringueiras são árvores nativas das Américas, mais especificamente do bioma amazônico. Há registros de que o povo nativo deste continente já usava o látex antes mesmo de o líquido obtido a partir da sangria no tronco das árvores ter esse nome. No começo do século XX, a borracha era chamada de ouro branco no Brasil, tamanha a riqueza que proporcionou aos produtores do norte do país. Até meados do século passado, o Brasil era o maior produtor de borracha do mundo e a produção concentrava-se na região da floresta Amazônica

Atualmente, o estado de São Paulo lidera a produção de borracha brasileira, respondendo por 68,2% do volume produzido (227.163 toneladas), segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A variedade da planta mais utilizada nos seringais daqui a RRIM 600, foi desenvolvida no Sudeste Asiático. RRIM é a sigla para Rubber Research Institute of Malaysia. A planta, entretanto, não é nativa daquele lugar que hoje lidera a produção mundial de borracha. Sementes de seringueiras estiveram no centro do mais famoso, e talvez o primeiro, caso de biopirataria do mundo.  

Depois de fazer a planta germinar em estufas na Inglaterra, as mudas foram introduzidas nas colônias inglesas que tinham clima mais apropriado. Isto é, a planta que é nativa do Brasil gera mais riquezas no Sudeste Asiático do que aqui. Mais: nos seringais brasileiros, a variação genética considerada de elite é aquela produzida na Malásia.

Biopirataria
O plantio da seringueira deixou de ser exclusivo no Brasil em 1876, quando o botânico inglês Henry Alexander Wickham (1846 – 1928) contrabandeou 70 mil sementes de seringueira do Pará para a Inglaterra. Foi um dos primeiros casos de biopirataria (exploração ou apropriação ilegal de recursos da fauna e da flora) de que se tem notícia no mundo.

As sementes coletadas por Wickham foram enviadas para a Inglaterra e germinaram no Jardim Botânico Real de Kew, em Londres. As poucas mudas obtidas após a germinação foram levadas para a Malásia e deram origem a todas as plantações de seringueira no Sudeste Asiático.

“A Malásia está usando ainda um germoplasma de seringueira que foi levado do Brasil no século XIX”, afirma Anete Pereira de Souza, pesquisadora do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética (CBMEG) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e coordenadora de um estudo que descreveu a diversidade genética da seringueira a partir da análise de mais de mil exemplares da planta disponíveis em bancos públicos de germoplasma na América do Sul, em publicação divulgada na Agência Fapesp (https://agencia.fapesp.br/estudo-possibilita-conhecer-epreservar-diversidade-genetica-da-seringueira/23045/)

A expansão da produção paulista é fruto da combinação de investimento de produtores e do avanço das pesquisas coordenadas pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC), além das características do solo e do clima. As primeiras mudam foram introduzidas em 1917, pelo fazendeiro José Procópio de Araújo Ferraz, no município de Gavião Peixoto (SP), na região de São Carlos (SP). O bom desenvolvimento dessas árvores em solo paulista e a ausência do fungo Microcyclus ulei, que dizimou o projeto de Henry Ford nos anos 1930, permitiram o plantio extensivo (plantation).

Em 1940, o IAC iniciou a plantação de seringueira nas estações experimentais de Campinas, Ribeirão Preto e Pindorama para certificar o bom desempenho da planta no estado. “A partir da avaliação positiva desses plantios, foi criado o programa de melhoramento genético e pesquisas agronômicas para estimular a produção no território paulista”, diz Roberto Botelho Ferraz Branco, pesquisador científico do Instituto Agronômico (IAC), da Unidade de Ribeirão Preto.

De acordo com Erivaldo José Scaloppi Junior, pesquisador científico do Centro de Seringueira e Sistemas Agroflorestais (CSSAF) do IAC, ações estratégicas realizadas na década de 1950, como a introdução de germoplasma nacional e internacional e a introdução de clones elites do Sudeste Asiático, como o RRIM 600 (Rubber Research Institute of Malaysia), combinadas com o trabalho de produtores pioneiros e trabalho de extensão da Secretaria de Agricultura de São Paulo, possibilitaram que São Paulo se tornasse o principal produtor de borracha natural do Brasil.

“Além de possuir solos com fertilidade e constituição físicas adequadas ao cultivo da seringueira. A seca nos meses de julho e agosto, período em que acontece a queda folhas e reenfolhamento, evita o ataque do fungo [Microcyclus ulei] às folhas recém emitidas pela planta, que causa danos irreversíveis e inviabiliza a produção da cultura”, explica Roberto.

305 municípios paulistas cultivam seringueiras em 132.659,12 hectares, sendo que 10% deles somam 50% da área estadual. Segundo o Instituto de Economia Agrícola (IEA), 65% da produção concentra-se nas regiões norte e noroeste do estado, sendo o município de São José do Rio Preto o maior produtor, com 29,7% da oferta, seguido por Votuporanga (12,2%), General Salgado (11,8%), Barretos (11,0%), Fernandópolis (6,3%), Catanduva (5,3%) e Jales (5,0%).

Com o objetivo de produzir látex para a fabricação dos pneus usados nos carros fabricados por sua indústria automobilística, o americano Henry Ford (1863-1947), fundador da Ford Motor Company, deu início, em 1927, a plantação de seringueiras às margens do rio Tapajós, em uma área no Pará, que recebeu o nome de Fordlândia, distrito que pertence ao município de Aveiro.

A Fordlândia foi uma grande área de terras adquiridas pelo empresário, por meio de sua empresa Companhia Ford Industrial do Brasil, por concessão do estado do Pará.

A iniciativa de Henry Ford de produzir borracha na Amazônia brasileira foi surpreendida pela doença do mal das folhas da seringueira, causada pelo fungo Microcyclus ulei, que arruinou as plantações.

Segundo Roberto Botelho Ferraz Branco, pesquisador científico do Instituto Agronômico (IAC), Ford tinha a expectativa de explorar a seringueira em sistema de ‘plantation’, onde se derrubava a mata nativa e se instalava o cultivo da seringueira. “Entretanto, esse sistema altera o equilíbrio ecológico da área, fato que propicia o desenvolvimento e ataque do fungo e inviabiliza a produção, o que não acontece no método de exploração extrativista, onde o seringueiro retira o látex da planta mantendo a mata viva”, explica.

Centro multidisciplinar de seringueira
A importância da heveicultura para o agronegócio e a possibilidade de avanços nas pesquisas científicas impulsionou a criação, em 2014, do Centro de Seringueira e Sistemas Agroflorestais (CSSAF) do Instituto Agronômico (IAC), em Votuporanga, único centro multidisciplinar de seringueira do Brasil.

A unidade de Votuporanga já realizava pesquisas com seringueira desde 1980, como uma das Estações Experimentais do IAC. Em 2002, foi elevada à categoria de Polo Regional do Noroeste Paulista, pertencente à Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (APTA). A unidade possui 30 hectares com seringueira.

O Centro de Seringueira e Sistemas Agroflorestais desenvolve pesquisas de melhoramento genético e estudos fitotécnicos para melhoria de rendimento da planta. Também possui o maior banco de germoplasma de seringueira do Brasil, com variedades nacionais de origem amazônica, além de outras desenvolvidas por instituições nacionais e internacionais.

Erivaldo José Scaloppi Junior, pesquisador científico do CSSAF, explica que a obtenção de novos clones é um processo longo, que leva cerca de 30 anos até a recomendação final ao setor produtivo. “O sucesso na obtenção de novos clones se deve a variabilidade genética para que as recombinações possam resultar em clones com expressivo ganho de produção, principalmente vigor, resistência às doenças e demais características secundárias. Para isso, recorre-se ao banco de germoplasma no desenvolvimento do processo de melhoramento genético”, explica.

O IAC já desenvolveu 31 novas variedades de seringueiras, que são disponibilizadas ao setor produtivo por meio do fornecimento de material de propagação com origem genética controlada. Dentre eles, a Série IAC 500, que apresenta produtividade de borracha acima de 70% em relação aos tradicionais clones. “A Série IAC 500 possui clones vigorosos com rápido crescimento, o que permite a antecipação de sangria em até dois anos, em relação à média de sete anos dos seringais. Os clones possuem dupla aptidão, ou seja, potencial para a produção de borracha e madeira”, salienta Erivaldo.

Além de obter novos clones, o programa de melhoramento genético de seringueira do IAC avalia clones oriundos de introdução, provenientes de instituições nacionais e internacionais, que necessitam de validação prévia da produção, adaptação e avaliação de caracteres secundários, para posterior recomendação aos produtores.

Existem ainda trabalhos com seringueira sendo realizados em apoio ao Centro de Seringueira nas estações experimentais de Ribeirão Preto, Pindorama e Colina, onde são avaliados os rendimentos de novos clones desenvolvidos no programa de melhoramento genético em Votuporanga. “A maior importância das pesquisas desenvolvidas pelo IAC está na geração de novos clones de seringueiras, o que garante aumento em produtividade e resistência a doenças com clones modernos disponibilizados ao heveicultor paulista”, explica Roberto, pesquisador científico da Unidade de Ribeirão Preto.

Cultivo
Existem diferenças entre o modo de produção no norte e no sudeste do país. Roberto explica que na Amazônia a produção da seringueira extrativista (seringais nativos) é baseada nas plantas nativas da floresta. “Essas plantas estão naturalmente dispersas de forma aleatória e dessa forma o caminho percorrido pelo seringueiro para realizar a sangria e extração do látex é dentro da selva amazônica. Nesse sistema o rendimento de produção é baixo devido ao número reduzido de plantas exploradas por jornada de trabalho”, argumenta.

Em São Paulo, as seringueiras são cultivas no sistema de ‘plantation’ (seringais de cultivo) no qual as árvores ficam disponíveis para sangria em espaçamento de 8m entre linha e 3m entre plantas, o que facilita a movimentação do serigueiro. “Essa maneira de exploração eleva bastante o rendimento e a produtividade de látex em comparação com o sistema extrativista da Amazônia”, diz Roberto.

Da família das Euphorbiaceae, a seringueira pertence ao gênero Hevea. Das onze espécies, a Hevea brasiliensis é a mais importante do gênero e do ponto de vista comercial. É uma planta perene, com longa vida útil, adaptável a grande parte do território nacional, sendo uma espécie arbórea de rápido crescimento, podendo atingir cerca de 30 metros de altura.

A produção de sementes inicia quatro anos após o plantio e a produção de látex sete anos depois, podendo se prolongar por 30 a 35 anos, com aproveitamento de madeira para processamento mecânico e energia (galhos) ao final deste período. A sangria para a produção da borracha acontece quando 50% das árvores atingem 45 cm de circunferência de tronco a 1,5 m do solo.

Segundo Roberto, dentre as vantagens do cultivo da planta está a estabilidade de produção, em torno de dois mil quilos de borracha ao ano, e a rentabilidade. “É uma cultura com rentabilidade ao longo de todo o ano. A retirada do látex é realizada durante 10 meses, sendo interrompida apenas nos meses de julho e agosto, devido à seca”.

O plantio pode ser feito pelo pequeno e grande produtor e é economicamente vantajoso a partir de 5 hectares. A seringueira pode ser plantada em sistema agroflorestal, em que espécies arbóreas (frutíferas e/ou madeireiras) são combinadas com cultivos agrícolas, como o café, cacau e banana, de forma simultânea ou em sequência temporal, promovendo benefícios econômicos e ecológicos.

O pesquisador aponta como desvantagens da cultura o tempo para o início da produção do látex. “Nesse período o agricultor precisa dispor de investimento para o plantio sem retorno financeiro”, argumenta. O preço da borracha natural praticado atualmente no mercado também é considerado uma desvantagem. “O quilo é cotado a R$ 2,50. Uma boa remuneração seria a partir de R$ 3,00”, destaca.

Marcelo Jamal Pereira é produtor de seringueira em Barretos há 30 anos. As primeiras árvores foram plantadas por seu pai, na década de 1980. Atualmente são 23 mil árvores, em 50 hectares. “A seringueira é uma cultura perene que tem altos e baixos. Já tivemos crises, mas muitas épocas boas”. Segundo ele, as plantações na região diminuíram ao longo dos anos devido à queda no preço do látex.

Para Marcelo, a grande vantagem da cultura é geração de emprego e o impacto social. “A extração do látex é uma atividade exclusivamente manual, gerando muitas oportunidades de trabalho. A cada seis hectares, em média, é preciso de um seringueiro”, argumenta.

Marcelo vende sua produção para usinas de beneficiamento, que transforma os coágulos de látex em GEB (Granulado Escuro Brasileiro), composto 100% de borracha natural. O material é utilizado na indústria pneumática.

Para o futuro, o produtor tem planos de transformar a área de plantio da seringueira em um local de visitação, educação ambiental e cursos de formação de profissionais para sangria.

Produção x importação
A seringueira é a maior fonte de borracha natural do mundo. Cerca de 50 mil produtos são derivados da matéria-prima, principalmente do setor automotivo, médico e de artefatos. Atualmente, 70% da produção total mundial de borracha natural é destinada à fabricação de pneus. Os outros 30% da produção são utilizados pela indústria de artefatos leves.

A borracha natural é o resultado da coagulação do látex da seringueira. “O látex coagulado é destinado à produção de materiais que necessitam de borracha natural em sua composição como solas de sapato, mangueiras de alta pressão, peças de plataforma petrolífera, e principalmente pneus de automóveis (30% da constituição de borracha natural), de caminhões (50% de borracha natural) e aviões (100% de borracha natural)”, diz Roberto, pesquisador científico do IAC.

De acordo com ele, o látex (sem coagular) é destinado à indústria para produção de materiais mais ‘refinados’ como luvas cirúrgicas, preservativos, bicos de mamadeira, entre outros diversos produtos.

O Brasil é o maior produtor de borracha natural da América Latina. Segundo dados do IBGE, na safra 2018/2019, a área destinada para colheita foi de 153.179 hectares e a produção foi de 333.117 toneladas de borracha natural. Os seringais geram cercam de 30,4 mil empregos formais no país, segundo dados da MBAgro, consultoria em agronomia.

O país já foi o maior produtor mundial de borracha natural no final do século XIX, início do século XX. Entre 1870 e 1920, a seringueira foi responsável por 25% das exportações do Brasil. Foi nesse período que o Brasil viveu o Ciclo da Borracha, importante momento histórico impulsionado pela extração de látex e comercialização da borracha e que proporcionou desenvolvimento econômico para a região amazônica.

A partir de 1910, ingleses e holandeses iniciaram a plantação de seringais em larga escala e a preços baixos nos países asiáticos, conquistando rapidamente o mercado mundial. O ciclo brasileiro da borracha entrou em declínio e na década de 1950, o país perdeu posto de maior produtor de borracha e iniciou a importação da matéria-prima. Hoje, os maiores produtores são a Tailândia, Indonésia, Malásia e Vietnã, que concentram 71% da produção mundial.

Atualmente o Brasil representa 1,5% da produção mundial da Hevea brasiliensis, e produz apenas 46% do que consome, sendo necessário a importação de 54% do produto para atender a demanda nacional, de acordo com a Associação Brasileira de Produtores e Beneficiadores de Borracha Natural (ABRABOR).

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