Estatuto da Cidade tornou-se uma das legislações urbanas mais importantes do mundo

08/jul/2021

Promulgada há quase 20 anos, lei definiu instrumentos para um planejamento urbano com propósito social
 

VÁRIOS AUTORES (nomes ao final do texto)

No dia 10 de julho de 2001, há quase 20 anos, o Diário Oficial da União publicava a lei federal 10.257, denominada Estatuto da Cidade, promulgando o que viria a se tornar hoje uma das legislações urbanas mais importantes do mundo, espinha dorsal da política urbana brasileira.

O trâmite e a aprovação pelo Congresso Nacional constituíram o ápice de anos de luta por cidades mais justas. A lei regulamenta, detalha e sustenta o capítulo urbano da Constituição de 1988, marco da garantia do direito à cidade em nosso país.

É importante compreender o real impacto dessa lei para as cidades no mundo, já que diversos países estabeleceram marcos e instrumentos inspirados nos seus preceitos.

O principal avanço consiste em definir instrumentos específicos para um planejamento urbano com propósito social, calcado na gestão democrática da cidade: outorga onerosa do direito de construir, IPTU progressivo, zonas especiais de interesse social e usucapião coletivo, entre outros.

Esses instrumentos viabilizam, na prática, o reconhecimento da função social da terra, da propriedade e da cidade. Em 2016, 15 anos após a sua aprovação, algumas dessas inovações foram finalmente incorporadas à agenda internacional por meio da Nova Agenda Urbana (NAU), documento-chave da Conferência Habitat III, que representa uma nova forma de planejar e gerir as cidades.

A legislação brasileira é vanguarda e fonte de inspiração até hoje e seria ainda mais se tivesse sido implementada na sua integralidade, de maneira mais robusta no conjunto de municípios do país.

Nesses 20 anos, pudemos observar o avanço paulatino do reconhecimento dos direitos da população residente em favelas e assentamentos informais, primordialmente a segurança contra remoções forçadas, que ainda persistem de forma significativa em outras regiões do sul global, onde a ocupação informal é sinônimo de ilegalidade.

Mas fomos além disso, pois uma diversidade de programas de urbanização de favelas resultou no aumento significativo da provisão de serviços públicos para mais de 2 milhões de domicílios, com projetos de requalificação e integração urbanas, ações que não seriam possíveis sem a base jurídica e legal do Estatuto da Cidade. No entanto, a realidade urbana brasileira nos demanda ir muito além disso.

Apesar de grandes avanços, como a outorga onerosa e a emissão de certificados de potencial adicional de construção (Cepac), uma questão que precisa ser mais explorada é a efetiva captura e redistribuição da mais valia urbana de maneira mais incisiva para viabilizar programas permanentes de combate à pobreza e à desigualdade, ainda predominantes em nossas cidades.

É também fundamental integrar melhor outras políticas setoriais na política urbana. Por exemplo, planos de mobilidade, de gestão integrada de resíduos sólidos, de habitação, de saneamento ambiental –que deveriam ser complementares e geralmente não são. O que revela que a efetivação e integração de direitos socioterritoriais demandam uma gestão urbana estruturada, mais além do plano diretor.

A emergência climática e outros marcadores de desigualdades sociais que se interseccionam com a dimensão territorial - por exemplo, o tema da equidade de gênero- demandam que o estatuto seja aplicado com real participação popular, em consonância com outros instrumentos de efetivação de direitos.

 

Para destacar sua atual importância, mas sobretudo para discutir o seu futuro, a Agência de Cooperação Alemã – Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH, o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), o Instituto de Arquitetos do Brasil – Departamento São Paulo (IAB-SP), o Cities Alliance, a Universidade Nove de Julho (Uninove) e outras instituições organizam um evento-manifesto nestas quarta (7) e quinta (8), com seminário, carta aberta e uma plataforma digital com experiências de aplicação da legislação.


ANA CLÁUDIA ROSSBACH é gerente regional para América Latina e Caribe do Cities Alliance.

DANIEL MONTANDON é diretor de arquitetura e urbanismo na Uninove.

FERNANDO TÚLIO SALVA ROCHA FRANCO é presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil - departamento São Paulo.

RAYNE FERRETTI é oficial nacional para o Brasil da ONU-Habitat.

THOMAZ RAMALHO é assessor técnico da Cooperação Técnica Alemã (GIZ) no Projeto ANDUS.

Fonte Folha de São Paulo

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